A guerra que devasta atualmente a Ucrânia internacionaliza-se. As
clivagens que aparecem nos Balcãs não são novas. Já
existiam durante o desmembramento da Jugoslávia e, anteriormente,
durante a Segunda Guerra mundial. Para Miroslav Lazanski, e uma velha
divisão que se repete.
Enquanto os voluntários croatas se juntam ao exército ucraniano
para combater os Novorrussos, a pró-Estados Unidos Kolinda
Grabar-Kitaroviæ tornou-se, em 18 de Fevereiro de 2015, presidente da
Croácia. O seu país, que se prepara para facilitar o
desmembramento da Servia amputando-a da Voivodina, deveria logicamente
implicar-se oficialmente na guerra na Ucrânia. Repetindo o passado, os
croatas aliam-se ao império do momento contra a Rússia.
Lev Tolstoi escreveu, em
Guerra e paz,
que "Na véspera do ano de 1812, houve uma
concentração dos poderes na Europa ocidental, partindo do Oeste
para Leste, em direcção às fronteiras da
Rússia". Não sei o que diria hoje este grande escritor e
pensador se pudesse dar uma olhadela sobre a Europa no princípio do
Século XXI. É como se ele tivesse já previsto na sua
época "a natização"
[1]
, o cerco da Rússia e as pressões políticas e
psicológicas sobre os Estados neutros para que se juntem à
Aliança.
O que começou na Europa em 1999 com os bombardeamentos da
República federal da Jugoslávia continua hoje com a
tragédia na Ucrânia. As imagens dos edifícios e pontes
destruídos são inacreditáveis; as casas queimadas, os
cadáveres nas ruas. Tudo isso na Europa do século XXI! E isto
não é um filme mas a crua realidade. A Europa política
calou-se em relação às mesmas imagens na Jugoslávia
em 1999, e hoje fica indiferente ao sofrimento humano na Ucrânia.
A Europa política impôs ao povo da Ucrânia uma escolha
"ou/ou" e, por isso, a guerra. Depois dos Acordos de Minsk 2
[2]
, algumas pessoas pensam ainda, na Europa, mas especialmente nos Estados
Unidos, que o facto de enviar ajuda militar a Kiev poderia mudar a
situação militar no terreno. Mas nenhum míssil anti-tanque
ocidental pode mudar a correlação de forças porque os
soldados de Kiev não foram treinados para os utilizar, teriam
necessidade pelo menos de seis meses de treino e aprendizagem. Os sistemas de
artilharia da NATO não são compatíveis com os sistemas em
poder das forças armadas ucranianas. O ocidente pode fornecer à
Ucrânia simples veículos blindados para transporte de artilharia,
o que os britânicos já fizeram, electrónica para as
comunicações rádio e radares de artilharia, o que
já foi entregue a Kiev.
Entretanto, se a NATO entregasse a Kiev outros tipos de armamento, ou se
enviasse os seus próprios especialistas de treino militar, poder-se-ia
ver aparecer em Donbass tanques T-80 e T-90 em vez dos T-72. Ver-se-ia
então que mísseis eram eficazes. A entrada de uma unidade da NATO
na Ucrânia provocaria a entrada das forças armadas russas no
teatro de operações. Num conflito convencional no terreno, nenhum
exército ocidental, mesmo o dos Estados Unidos, poderia vencer o
exército russo, porque os generais ocidentais esquecem completamente a
doutrina do Marechal Otarkov, sempre actual no exército russo: vencer na
primeira fase do conflito convencional pela destruição dos alvos
em profundidade no território inimigo nos primeiros momentos da guerra e
conquistar rapidamente o território inimigo para fazer avançar as
forças terrestres.
É uma vitória total na primeira fase da guerra, uma
vitória sem utilização de armamento nuclear
táctico. A estratégia da ofensiva, com o objectivo de
penetração profunda no território inimigo sem utilizar
armas nucleares, foi a essência da visão soviética da
guerra na Europa. Os Estados Unidos tentaram fazer melhor com a doutrina da
"batalha ar-terra 2000"
É precisamente esta a razão pela qual nem os EUA nem a NATO
enviaram as suas forças para a Ucrânia, porque não teriam
nenhuma hipótese de vencer numa guerra convencional. Com efeito, se as
tropas da NATO ou dos EUA se encontrassem em situação de
inferioridade na Ucrânia face ao exército russo, Bruxelas e
Washington teriam de escolher entre admitir a derrota com todas suas
consequências políticas e militares, ou utilizar os seus
lançadores munidos com armas nucleares tácticas.
Nesta situação, sabendo que os Tomahawks podem atingir alvos na
Rússia em cinco ou seis minutos, o Kremlin teria pouco tempo para
decidir, ordenar e executar uma resposta nuclear. Teria de intervir ao fim de
três minutos no máximo, caso contrário não poderia
lançar a contra-ofensiva, tendo os mísseis dos Estados Unidos
atingido já os seus alvos russos.
Dito de outra maneira, a fronteira entre a utilização
táctica e estratégica de armamento nuclear é perigosa. O
risco de implosão é assustador, uma e outra parte poderia
interpretar a utilização de armamento táctico nuclear como
a introdução da utilização de armamento nuclear
estratégico. Neste caso, só Deus poderia ajudar o planeta.
Segundo a opinião do professor Lowell Wood, do Laboratório
Nacional de Livermore (EUA), com data de 1982, entre 500 milhões e 1,5
mil milhões de pessoas pereceriam. E como a tecnologia nuclear progrediu
entretanto, o número de mortos seria muito maior.
Será que os que querem internacionalizar o conflito ucraniano pensam
nisto?
A opinião pública na Rússia está surpreendida
nestes dias com a chegada de cidadãos croatas para reforçar o
exército de Kiev, do Pravyi Sektor e da Guarda Nacional da
Ucrânia. Apenas os que não conhecem a história ficam
surpreendidos. Os soldados do Estado Independente croata bateram-se, durante a
Segunda Guerra mundial, ao lado de Hitler em Estalinegrado, enquanto na frente
Leste não esteve nenhum sérvio. O Estado Independente croata
enviou a sua aviação para a frente Leste. O general Franjo Dzal
era um dos pilotos que abatia aviões russos. Na época da
ex-Jugoslávia, a Croácia tinha excelentes relações
com a Ucrânia e a Sérvia com a Rússia. Em que medida a
religião teve influência na situação (na
Ucrânia há católicos e uniatas
[3]
é uma longa história. De qualquer modo, os croatas estiveram ao
lado da Ucrânia e os sérvios, segundo os seus voluntários,
do lado de Donbass.
Balcanizou-se a Ucrânia. Continua a guerra que parámos em
1945…