sexta-feira, julho 17, 2015

Maioria dos dirigentes do Syriza está contra o acordo

Reunião do grupo parlamentar do Syriza. Foto Left.gr

Uma declaração subscrita por 109 dos 201 membros do Comité Central do Syriza exige uma reunião do órgão dirigente para recusar “o golpe contra a democracia e a soberania popular” por parte dos líderes europeus. A ministra adjunta das Finanças declara-se contra o novo ultimato e apresentou a demissão do governo.


“Exigimos uma reunião urgente do Comité Central do Syriza e convidamos todos os membros a protegerem a unidade do partido, na base das decisões da conferência e dos seus compromissos programáticos”, diz a declaração subscrita pela maioria do Comité Central.
“Este acordo não é compatível com as ideias e os princípios da esquerda, e em especial com as necessidades da população. Esta proposta não pode ser aceite pelos governantes do Syriza”, acrescenta a declaração publicada no dia da votação das medidas prévias à negociação do acordo final.
Os dirigentes do Syriza consideram que “a 12 de julho teve lugar em Bruxelas um golpe que mostra que o objetivo dos líderes da Europa era o extermínio exemplar de um povo que ousou escolher um caminho diferente do modelo neoliberal de austeridade extrema”.

Nadia Valavani é a primeira baixa no governo dos críticos do acordo

Depois da demissão de Nikos Chountis, o ex-líder da bancada do Syriza em Estrasburgo, que abandona o governo para substituir Manolis Glezos no Parlamento Europeu, esta quarta-feira surgiu a primeira demissão justificada pela oposição ao acordo com os credores.
Nadia Valavani, ministra adjunta das Finanças, escreveu uma carta a explicar as razões da demissão, defendendo que a assinatura do acordo irá enterrar o potencial emancipatório criado com a vitória do Syriza em janeiro e do Oxi no referendo deste mês. “Uma coisa é enfrentarmos uma realidade extremamente difícil e lidar com o desastre com uma perspetiva de esperança num futuro com dignidade, soberania e independência. Outra bem diferente é lidar com um desastre que irá consumir o rendimento nacional que resta para o transferir para fora, com o pagamento eterno de uma dívida que é insustentável”, acrescentou.

Leia aqui a declaração subscrita por 109 dirigentes do Syriza

A 12 de Julho teve lugar um golpe de estado em Bruxelas, que demonstrou o objectivo dos dirigentes europeus: infligir uma punição exemplar a um povo que imaginou outro caminho, diferente do modelo neoliberal de austeridade. Foi um golpe de estado dirigido contra toda a nação de democracia e de soberania popular.
O acordo assinado coms as “instituições” foi o resultado de ameaças de estrangulamento económico imediato e representa um novo protocolo impondo condições humilhantes, odiosas, e uma tutela destrutivas para o nosso país e o nosso povo.
Estamos conscientes da asfixia das pressões que foram exercidas sobre a parte grega, mas consideramos por outro lado que a luta avançada dos trabalhadores aquando do referendo não autoriza o governo a renunciar sobre as pressões exercidas pelos credores.
Este acordo não é compatível com as ideias e os princípios da esquerda, mas acima de tudo não é compatível com as necessidades da classe operária.
Esta proposta não pode ser aceite pelos militantes e quadros do Syriza.
Pedimos ao comité central uma reunião imediata e convidamos todos os militantes , quadros e deputados do Syriza a preservarem a unidade do partido tendo por base a nossa conferência, as decisões tomadas e os compromissos em matéria de programa
Atenas, 15 de Julho de 2015
(traduzido pelo blogue Aventar a partir de uma versão francesa do texto original publicado por Stathis Kouvelakis)


Leia aqui o “acordo” de Bruxelas (anotado por Varoufakis)

Yanis Varoufakis. Foto União Europeia ©

O ex-ministro das Finanças grego decidiu dar a conhecer as suas notas pessoais sobre o texto que serviu de acordo em Bruxelas e no qual, poucos dias depois, já quase ninguém diz acreditar.

A Cimeira do Euro sublinha a necessidade crucial de restabelecer a confiança com as autoridades gregas [i.e. o governo grego deve introduzir austeridade severa que atinja os mais fracos, que já sofreram gravemente], como pré-requisito para um eventual acordo futuro sobre um novo programa do Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) [i.e. para um novo empréstimo para adiar e fingir].
Neste contexto, é fundamental que as autoridades gregas assumam as suas responsabilidades [i.e. o governo do Syriza deve assinar uma declaração a dizer que se passou para a “lógica” da troika] e que os compromissos políticos sejam seguidos de uma aplicação bem sucedida.
Um Estado-Membro da área do euro que solicite assistência financeira do MEE deverá apresentar, sempre que possível, um pedido semelhante ao FMI. Esta é uma condição prévia para o Eurogrupo chegar a acordo sobre um novo programa do MEE. Consequentemente, a Grécia solicitará a assistência continuada do FMI (acompanhamento e financiamento) a partir de março de 2016 [i.e. Berlim continua a acreditar que a Comissão não é de confiança para ser “polícia” dos próprios programas de “resgate” europeus].
Dada a necessidade de restabelecer a confiança com a Grécia, a Cimeira do Euro saúda os compromissos assumidos pelas autoridades gregas no sentido de legislarem sem demora sobre um primeiro conjunto de medidas [i.e. a Grécia deve sujeitar-se ao afogamento orçamental, mesmo antes de ser garantido algum financiamento]. As referidas medidas basear-se-ão integralmente num acordo prévio com as Instituições e incluirão:
até 15 de julho
– a racionalização do sistema do IVA e o alargamento da base de tributação para aumentar as receitas [i.e. dar um golpe profundo à única indústria em crescimento da Grécia – o turismo];
– a adoção de medidas imediatas para melhorar a sustentabilidade a longo prazo do sistema das pensões, no âmbito de um vasto programa de reforma das pensões [i.e. reduzir as pensões mais baixas, ignorando que a razia no capital dos fundos de pensões se deveu ao PSI da troika em 2012 e aos efeitos nefastos da queda no emprego e do trabalho não declarado];
– a garantia da total independência jurídica do ELSTAT (autoridade estatística grega) [i.e. a troika exige controlo absoluto sobre a forma como o equilíbrio orçamental é calculado, para assim controlar por inteiro a agnitude da austeridade que impõe ao governo];
– a plena aplicação das disposições pertinentes do Tratado sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária, em particular, tornando o Conselho Orçamental plenamente operacional antes da finalização do Memorando de Entendimento e introduzindo cortes quase automáticos nas despesas no caso de desvios em relação aos objetivos ambiciosos para o saldo primário, depois de consultado o Conselho Orçamental e sob reserva de aprovação prévia pelas Instituições [i.e. o governo grego, que sabe que as metas orçamentais impostas nunca serão atingidas com a austeridade imposta, deve comprometer-se a nova e automática austeridade que resulte de novos erros da troika];
até 22 de julho
– a adoção do Código de Processo Civil, que representa uma importante reformulação dos procedimentos e disposições do sistema de justiça civil e pode acelerar significativamente o processo judicial, bem como reduzir os custos [i.e. execuções de hipotecas, despejos e liquidação de milhares de casas e empresas que não estejam em condições de continuar a pagar as suas hipotecas/empréstimos];
– a transposição da Diretiva Recuperação e Resolução Bancárias, contando com o apoio da Comissão Europeia.
Somente após a aplicação jurídica das primeiras quatro medidas supramencionadas e a aprovação pelo Parlamento grego, bem como a verificação pelas Instituições e o Eurogrupo, de todos os compromissos incluídos no presente documento se poderá tomar, de forma imediata, a decisão de mandatar as Instituições para negociar um Memorando de Entendimento [i.e. o governo do Syriza deve ser humilhado ao ponto em que lhe pedem para impor dura austeridade como primeiro passo para pedir outro empréstimo tóxico, do mesmo tipo dos que o Syriza ficou internacionalmente famoso por combater].
A tomada dessa decisão ficará sujeita à conclusão dos procedimentos nacionais e ao cumprimento das condições prévias estabelecidas no artigo 13.º do Tratado MEE, com base na avaliação a que se refere o n.º 1 desse artigo. Para que haja uma base para a celebração bem-sucedida do Memorando de Entendimento, as medidas de reforma propostas pela Grécia precisam de ser seriamente reforçadas para terem em conta a situação económica e orçamental do país, que se deteriorou gravemente durante o último ano [i.e. o governo do Syriza deve aceitar a mentira de que ele, e não as táticas de estrangulamento dos credores, causou a deterioração aguda da economia nos últimos seis meses – pedem à vítima que assuma a culpa no lugar do vilão].
O Governo grego precisa de se comprometer formalmente a reforçar as suas propostas [i.e. a torná-las mais recessivas e desumanas] numa série de domínios identificados pelas Instituições, com um calendário claro e satisfatório para a adoção de legislação e a sua aplicação, incluindo marcos de referência estruturais, etapas e marcos de referência quantitativos, a fim de haver clareza quanto à orientação das políticas a médio prazo.
Em acordo com as Instituições, necessita nomeadamente de:
– levar a cabo ambiciosas reformas das pensões e especificar políticas para compensar integralmente o impacto orçamental da decisão do Tribunal Constitucional sobre a reforma das pensões de 2012 [i.e. cancelar a decisão do Tribunal a favor dos pensionistas] e implementar a cláusula de “défice zero” [i.e. cortar em 85% as pensões suplementares que o governo do Syriza defendeu com unhas e dentes nos últimos cinco meses] ou medidas alternativas mutuamente aceitáveis [i.e. encontrar vítimas “equivalentes] até outubro de 2015;
– adotar reformas mais ambiciosas para o mercado de produtos, com um calendário preciso para a aplicação de todas as recomendações do Guia de Avaliação de Concorrência da OCDE (volume 1) [i.e. as recomendações que a OCDE afastou após ter redesenhado estas reformas em colaboração com o governo do Syriza], incluindo o comércio ao domingo, as épocas de saldos, a propriedade das farmácias, o leite e as padarias, com exceção dos produtos farmacêuticos não sujeitos a receita médica, que serão incluídos numa próxima fase, bem como para a abertura de profissões fechadas que são cruciais no plano macroeconómico (por exemplo, o transporte por ferry). No seguimento do Guia de Avaliação da Concorrência da OCDE (volume 2), a indústria transformadora terá de ser incluída nas ações prévias;
– no que respeita aos mercados da energia, prosseguir a privatização do operador da rede de transporte de eletricidade (ADMIE) exceto se forem encontradas medidas de substituição que tenham efeitos equivalentes na competitividade, conforme acordado pelas Instituições [i.e. a ADMIE será vendida a interesses instalados estrangeiros a mando as Instituições];
– no que respeita aos mercados de trabalho, levar a cabo um reexame e uma modernização rigorosos da negociação coletiva [i.e. assegurar que nenhuma negociação coletiva será permitida], da ação laboral [i.e. que deve ser proibida] e, em conformidade com a diretiva e as melhores práticas da UE nesta matéria, dos despedimentos coletivos [i.e. devem ser permitidos por capricho do patrão], em sintonia com o calendário e a abordagem acordados com as Instituições [i.e. a troika decide].
Com base nestas avaliações, as políticas do mercado de trabalho deverão ser alinhadas pelas boas práticas internacionais e europeias, e não deverão passar pelo regresso a políticas do passado que não são compatíveis com os objetivos da promoção do crescimento sustentável e inclusivo [i.e. não pode haver mecanismos que o trabalho assalariado possa usar para obter melhores condições por parte dos empregadores];
– adotar as medidas necessárias para reforçar o setor financeiro, nomeadamente medidas decisivas quanto aos empréstimos improdutivos [i.e. um tsunami de execuções fiscais e está ante portas] e medidas para reforçar a governação do Fundo Helénico de Estabilidade Financeira (HFSF) e dos bancos [i.e. o povo grego que sustenta o HFSF e os bancos terão precisamente zero controlo sobre o HFSF e os bancos], eliminando, em particular, qualquer possibilidade de ingerência política, sobretudo nos processos de nomeação [i.e. à exceção da interferência política da troika]. Além disso, as autoridades gregas devem tomar as seguintes medidas:
– desenvolver um programa de privatizações significativamente reforçado e com uma melhor governação. Serão transferidos ativos gregos de valor para um fundo independente que monetizará os ativos através de privatizações e de outros meios [i.e. um Treuhand à moda da Alemanha Oriental deverá vender toda a propriedade pública mas sem os investimentos equivalentes que a Alemanha Ocidental pôs na Alemanha Oriental em compensação pelo desastre do Treuhand]. A monetização dos ativos será uma das fontes para proceder ao reembolso agendado do novo empréstimo do MEE, e gerar, em todo o ciclo de vida do novo empréstimo, um total que se pretende atinja os 50 mil milhões de EUR, dos quais 25 mil milhões serão usados para o reembolso da recapitalização dos bancos e outros ativos e 50% de cada euro remanescente (ou seja, 50% de 25 mil milhões de EUR) serão usados para reduzir o rácio dívida/PIB e os restantes 50% serão usados para investimentos [i.e. a propriedade pública será vendida e as magras receitas vão para o serviço de uma dívida impagável – nada sobrando para o investimentopúblico ou privado]. Este fundo será estabelecido na Grécia e gerido pelas autoridades gregas sob a supervisão das Instituições europeias pertinentes [i.e. ficará em nome da Grécia, mas, tal como o HFSF e o Banco da Grécia, será controlado em absoluto pelos credores]. Mediante acordo com as Instituições e com base nas melhores práticas internacionais, deverá ser adotado um quadro legislativo para garantir a transparência dos procedimentos e a adequada fixação do preço de venda dos ativos, de acordo com os princípios e normas da OCDE em matéria de gestão das empresas públicas;
– em consonância com as ambições do Governo grego, modernizar e reforçar significativamente a administração grega, e implementar um programa, sob os auspícios da Comissão Europeia, para o reforço das capacidades e a despolitização da administração grega [i.e. tornar a Grécia numa zona livre de democracia feita em Bruxelas, uma forma de governo supostamente tecnocrático, que é tóxico politicamente e inepto do ponto de vista macroeconómico]. Deverá ser apresentada uma primeira proposta até 20 de julho, após os debates com as Instituições. O Governo grego compromete-se a reduzir ainda mais os custos da administração grega [i.e. reduzir os salários mais baixos enquanto aumenta um pouco os salários de alguns apparatchiks simpatizantes da troika], em conformidade com o calendário acordado com as Instituições;
– normalizar plenamente os métodos de trabalho com as Instituições, incluindo as necessárias ações no terreno, em Atenas, a fim de melhorar a execução e o acompanhamento do programa [i.e. a troika contra-ataca e exige que o governo grego a convide para regressar a Atenas como Conquistador – a “paz cartaginesa” em todo o seu esplendor]. O Governo precisa de consultar as Instituições e acordar com estas em tempo útil todos os projetos legislativos nos domínios relevantes antes de os submeter a consulta pública ou de os apresentar ao Parlamento [i.e. o parlamento grego deve, uma vez mais, após breves cinco meses de independência, ser um apêndice da troika – aprovando leis traduzidas mecanicamente]. A Cimeira do Euro volta a realçar que a execução é fundamental; nesse contexto, saúda a intenção das autoridades gregas de lançar às Instituições e aos Estados-Membros, até 20 de julho, um pedido de assistência técnica, e pede à Comissão Europeia que coordene este apoio da Europa;
– com exceção da lei da crise humanitária, o Governo grego reexaminará, tendo em vista a sua alteração, a legislação introduzida que é contrária ao acordo de 20 de fevereiro, voltando a alinhá-la pelos anteriores compromissos do programa, ou identificará equivalentes compensatórios claros para os direitos adquiridos que foram subsequentemente criados [i.e. para além de prometer que não voltará a legislar de forma autónomoa, o governo grego irá anular retroativamente as leis que aprovou nos últimos cinco meses].
Os compromissos acima enumerados constituem os requisitos mínimos para encetar as negociações com as autoridades gregas. No entanto, a Cimeira do Euro deixou bem claro que o início das negociações não exclui um eventual acordo final sobre um novo programa do MEE, que terá de basear-se numa decisão sobre a totalidade do pacote (incluindo as necessidades de financiamento, a sustentabilidade da dívida e um eventual financiamento intercalar) [i.e. autoflagelar-se, impor mais austeridade a uma economia esmagada pela austeridade, e depois logo se vê se o Eurogrupo vos enterrará com novos empréstimos tóxicos e insustentáveis].
A Cimeira do Euro toma nota das possíveis necessidades de financiamento do programa, que oscilam entre 82 e 86 mil milhões de EUR de acordo com a avaliação das Instituições [i.e. o Eurogrupo fez aparecer um número gigantesco, bem maior que o necessário, para assinalar que a restruturação da dívida está afastada e que a escravidão da dívida ad infinitum é a regra do jogo]. A Cimeira do Euro convida as Instituições a explorar as possibilidades de reduzir o pacote de financiamento através de uma via orçamental alternativa ou de um aumento das receitas das privatizações [i.e. e até pode ser possível que os porcos voem]. O restabelecimento do acesso aos mercados, que constitui um objetivo de qualquer programa de assistência financeira, reduz a necessidade de utilizar à totalidade do envelope de financiamento [i.e. o que é algo que os credores farão tudo para evitar, por exemplo assegurando que a Grécia só entrará no programa de ‘quantitative easing’ do BCE em 2018, quando o ‘quantitavive easiing’ chega… ao fim].
A Cimeira do Euro toma nota das prementes necessidades de financiamento da Grécia, que realçam a necessidade de progredir muito rapidamente na obtenção de uma decisão sobre um novo Memorando de Entendimento: de acordo com as estimativas, são necessários 7 mil milhões de EUR até 20 de julho e mais 5 mil milhões de EUR até meados de agosto [i.e. “adiar e fingir”, aqui em nova versão]. A Cimeira do Euro reconhece a importância de assegurar que o Estado soberano grego possa pagar ao FMI e ao Banco da Grécia os montantes em atraso e honrar as suas obrigações de dívida nas próximas semanas, a fim de criar condições que permitam uma conclusão ordenada das negociações. Se as negociações não forem concluídas rapidamente, será a Grécia a suportar todos os riscos [i.e. uma vez mais, pedem que a vítima assuma a culpa no lugar do vilão]. A Cimeira do Euro convida o Eurogrupo a debater urgentemente estas questões.
Atendendo aos graves desafios com que se depara o setor financeiro grego, o pacote total de um possível novo programa do MEE teria de incluir o estabelecimento de uma reserva de 10 a 25 mil milhões de EUR para o setor bancário a fim de responder às potenciais necessidades de recapitalização bancária e aos custos de resolução, sendo que 10 mil milhões desse montante seriam disponibilizados imediatamente numa conta separada no MEE [i.e. a troika admite que a recapitalização dos bancos em 2013-2014, que só necessitava no máximo de uns 10 mil milhões, foi insuficiente – mas, como é óbvio, põe as culpas… no governo do Syriza].
A Cimeira do Euro está ciente de que uma rápida decisão sobre o novo programa é uma condição para permitir a reabertura dos bancos, evitando assim um aumento do pacote de financiamento total [i.e. A troika fechou os bancos da Grécia para obrigar o governo do Syriza a capitular e agora grita pela sua reabertura]. O BCE/MUS procederá a uma avaliação completa depois do verão. A reserva global permitirá suprir os eventuais défices de capital na sequência da avaliação completa efetuada depois de o quadro legal ter sido aplicado.
Existem graves preocupações quanto à sustentabilidade da dívida grega [N.b. A sério? Ena!]. Isso deve-se ao afrouxamento das políticas durante os últimos doze meses, o que resultou na recente deterioração do enquadramento macroeconómico e financeiro a nível interno [i.e. não foram os “resgates” de adiar e fingir de 2010 e 2012 que, juntamente com a austeridade destruidora do PIB, que levaram a uma dívida a disparar – foi a pespetiva, e a realidade, de um governo que criticou os empréstimos dos “resgates” de Adiar e Fingir que… levaram à Insustentabilidade da Dívida!].
A Cimeira do Euro recorda que os Estados-Membros da área do euro têm adotado, ao longo dos últimos anos, um considerável conjunto de medidas para apoiar a sustentabilidade da dívida da Grécia, o que facilitou o serviço da dívida grega e reduziu significativamente os custos [i.e. o 1º e 2º programas de “resgate” fracassaram, a dívida disparou como tinha de disparar, já que o verdadeiro objetivo dos programas de “resgate” era transferir as perdas dos bancos para os contribuintes europeus]. Sendo este o pano de fundo, no contexto de um eventual programa futuro do MEE, e em consonância com o espírito da declaração do Eurogrupo de novembro de 2012 [i.e. uma promessa de restruturação da dívida aos anteriores governos gregos que nunca foi cumprida pelos credores], o Eurogrupo mantém-se disposto a ponderar, se necessário, possíveis medidas adicionais (eventual alargamento dos períodos de carência e dos prazos de pagamento) a fim de assegurar que as necessidades de financiamento brutas se mantenham a um nível sustentável. Estas medidas ficarão dependentes da aplicação integral das medidas a acordar num eventual novo programa, e serão ponderadas após a primeira conclusão positiva da avaliação [i.e. Uma vez mais, a troika deixará o governo grego trabalhar sob uma dívida impagável e quando, em consequência disso, o programa falhar, a pobresa aumentar ainda mais e os rendimentos caírem muito mais, aí podemos cortar parte da dívida – como fez a troika em 2012].
A Cimeira do Euro salienta que não podem ser efetuados cortes nominais da dívida [N.b. O governo do Syriza tem proposto, desde janeiro, uma restruturação moderada da dívida, com nenhum corte, maximizando o valor atual líquido previsto dos reembolsos aos credores – o que foi semrpe recusado pela troika porque o seu objetivo era, simplesmente, humilhar o Syriza]. As autoridades gregas reiteram o seu inequívoco compromisso de honrar de forma integral e atempada as obrigações financeiras que assumiram para com todos os seus credores [N.b. o que só poderá acontecer após uma restruturação substancial da dívida]. Desde que estejam reunidas todas as condições necessárias contidas no presente documento, o Eurogrupo e o Conselho de Governadores do MEE podem, em conformidade com o artigo 13.º, n.º 2, do Tratado MEE, conferir mandato às Instituições para negociar um novo programa do MEE, se estiverem reunidas as condições prévias do artigo 13.º do Tratado MEE com base na avaliação referida no artigo 13.º, n.º 1. Para apoiar o crescimento e a criação de emprego na Grécia (nos próximos 3 a 5 anos)[N.b. Após destruírem o emprego e o crescimento nos últimos cinco anos…], a Comissão trabalhará em estreita colaboração com as autoridades gregas para mobilizar um montante que poderá ascender a 35 mil milhões de euros (ao abrigo de vários programas da UE) para financiar o investimento e a atividade económica, incluindo o investimento nas PME [i.e. Usará a mesma ordem de grandeza dos fundos estruturais, mais algum dinheiro a fingir, como o que esteve disponível em 2010-2014]. Como medida excecional e atendendo à situação única da Grécia, a Comissão irá propor um aumento de mil milhões de euros do nível de pré-financiamento para dar um impulso imediato ao investimento, a analisar pelos colegisladores da UE [i.e. Dos tais 35 mil milhões anunciados, leiam-se estes mil milhões como dinheiro a sério]. O Plano de Investimento para a Europa também proporcionará oportunidades de financiamento para a Grécia [i.e. o mesmo plano que a maioria dos ministros da zona euro chamam um programa fantasma].
Por InfoGrécia

O pacote do primeiro-ministro Tsipras

Um acto de traição contra o povo grego

por Michel Chossudovsky
Cartoon de Michael Kountouris. Depois de ter lançado um Referendo a fim de refutar e recusar o acordo de salvamento externo (bailout) preparado pela Troika, o primeiro-ministro Tsipras juntamente com o seu recém empossado ministro das Finanças, saiu-se quatro dias depois com um pacote de austeridade muito semelhante àquele que em Junho fora rejeitado pelo governo grego.

Esta meia-volta foi cuidadosamente engendrada. O povo grego foi iludido e enganado. O Referendo foi um absoluto "ritual de democracia".

Tsipras fez um acordo com os credores. Ele era desde o princípio favorável à aceitação das exigências dos credores.

Tsipras efectuou a campanha do "NÃO" tendo já decidido que no rastro do Referendo ele diria SIM aos credores e se dobraria às suas exigências. Isto equivale a um Acto de Traição.

Não houve tentativa por parte do governo Tsipras, na sequência imediata do Referendo, de renegociar ou estender o prazo final em nome do povo grego em resposta ao Voto NÃO.
Na manhã de segunda-feira, no dia seguinte ao Referendo, Yanis Varoufakis, que havia liderado as negociações com Troika, resignou como ministro das Finanças. Será que ele resignou por vontade própria ou foi "demitido" para facilitar um acordo com a Troika?

Sabe-se que os credores influenciam nomeações para postos ministeriais chave (exemplo: Coreia do Sul, Dezembro de 1997 na altura da Crise Asiática, o ministro das Finanças e o governador do Banco Central são demitidos por ordens de Washington).

Varoufakis foi apressadamente substituído por Euclid Tsakalotos, que tomou posse segunda-feira de manhã. Sua nomeação como ministro das Finanças e negociador chefe (a qual deve ter sido conhecida bem antecipadamente) foi amplamente saudada pelo establishment político e financeiro da UE.

O primeiro-ministro Alexis Tsipras juntamente com o seu novo ministro das Finanças efectuaram então reuniões na segunda-feira tanto com o Syriza como com a oposição. E no fim do dia, uma "declaração conjunta" foi rapidamente assinada "por quase todo o espectro político em apoio aos seus esforços para procurar um novo acordo por parte dos credores do país".

Tsipras disse depois ao Parlamento que o seu governo fora forçado a dobrar-se às exigências dos credores. Ele também disse que o referendo não autoriza o governo a encarar o Grexit, nomeadamente uma saída da eurozona.

O que ele deixou de mencionar é que o Voto NÃO lhe dera um mandato político para renegociar o acordo em nome do povo grego tendo em vista pelo menos aliviar os impactos mortais das medidas de austeridade propostas.


Na quinta-feira, um documento de 13 páginas contendo reformas concretas e medidas de austeridade foi enviado à Troika. A iniciativa destinava-se, segundo informações dos media, a "actuar como fundamento para libertar um novo pacote de três anos de bailout de 53,5 mil milhões de euros para salvar a nação da bancarrota".

Gregos queimam a bandeira do Syriza em praça pública. Estas propostas esboçadas no documento de 13 páginas explicitavam o desastre grego.

Elas envolviam aumentos maciços de impostos, uma redução drástica nos salários do sector público, cortes em pensões incluindo um aumento na idade de reforma para 67 anos, a privatização de activos do Estado incluindo empresas de utilidade pública e infraestrutura: "O governo procurará liquidar activos do Estado e por em andamento a privatização da rede da companhia de electricidade, aeroportos e portos regionais incluindo Pireu e Salónica".

Neoliberalismo e "remédios económicos" mortais postos em prática por um partido "de esquerda". Abaixo alguns destaques destas propostas (negritos acrescentados):

As propostas incluem uma grande quantidade de aumentos de impostos incluindo uma taxa de 23 por cento de IVA sobre restaurantes e catering, uma taxa reduzida de 13% sobre alimentos básicos, energia, hotéis e água e uma assim chamada taxa "super reduzida" de 6% sobre coisas como produtos farmacêuticos, livros e teatro – talvez apropriada para um país que foi o pioneiro na tragédia. Os novos níveis de impostos arrancarão em Outubro próximo. [Estes aumentos de impostos matarão a indústria turística e desencadearão bancarrotas de restaurantes e hotéis locais]

Além disso, reduções especiais de impostos para as ilhas do país – pontos de atracção turísticos – serão liquidadas. Só as ilhas mais remotas conseguirão manter as cobiçadas isenções fiscais.

Os gastos militares serão cortados em 100 milhões de euros este ano e o dobro disso em 2016. Os impostos sobre as empresas aumentarão de 26 para 28% e os agricultores perderão seu tratamento fiscal preferencial e os subsídios de combustível. [Isto desencadeará bancarrotas de agricultores]

O governo está à procura de reformas que em 2015 tragam poupanças permanentes de 0,25% a 0,5% do produto interno bruto e de 1% do PIB em 2016 e além. Medidas destinadas a atingir estes números incluem desencorajar a reforma antecipada e padronizar a idade de reforma nos 67 anos em 2022 – excepto para aqueles que desempenham "trabalhos árduos" e mães que criem crianças com uma deficiência. [atrasar a idade de reforma também contribui para aumentar o desemprego juvenil]

Pensões sociais serão melhor direccionadas, ao passo que fundos de pensão suplementares serão financiados por contribuições dos próprios empregados. Benefícios tais como um fundo de solidariedade serão gradualmente cancelados e contribuições de saúde para pensionistas saltarão em média de 4 para 6%. Mais reformas terão início para fazer o sistema de pensões mais sustentável, incluindo uma revisão de contribuições de pensões para todos os auto-empregados. [A redução drástica de benefícios sociais desencadeará pobreza em massa]

As autoridades modelarão os salários do sector público para assegurar que estejam numa trajectória descendente em 2019 e que se ajustem à "qualificação, desempenho e responsabilidade" do pessoal. [Destruição do sector público]


Correcções nas leis de insolvência terão como objectivo conseguir que devedores reembolsem empréstimos, enquanto consultores ajudarão a tratar de maus empréstimos. Serão também tomados passos para conseguir que investidores estrangeiros despejem o seu dinheiro em bancos gregos.

O governo abrirá profissões restritas tais como de engenheiro, notário e oficial de justiça. Ele formulará leis destinadas a livrar-se de burocracia e a tornar mais fácil obter licenças de negócios, assim como reformando o mercado do gás.

O governo procurará vender activos do Estado e começará a privatizar a companhia proprietária da rede eléctrica, aeroportos e portos regionais incluindo Pireu e Salónica. [Uma prenda para investidores estrangeiros, os quais adquirirão as empresas de serviços públicos e a infraestrutura do país]
O que não é explicitamente mencionado no documento de 13 páginas é a lógica do "investimento abutre", que leva à morte final do "capitalismo grego" incluindo sua indústria bancária, comercial e de estaleiros navais.

(Os elementos essenciais tanto da declaração conjunta como do documento de 13 páginas foram sem dúvida redigidos antes do Referendo).

Quem são os actores principais?

A Troika está a actuar por conta das instituições credoras. Eles não dão as ordens. O BCE é integrado por indivíduos que estão em estreita ligação com os principais interesses da banca incluindo JP Morgan Chase, Deutsche Bank e Goldman Sachs.

Analogamente, o FMI (que é essencialmente uma burocracia para a arrecadação de dívida) faz parte do chamado Consenso de Washington, com ligações ao Tesouro dos EUA, a think tanks económicos de Washington e naturalmente à Wall Street.

Houve divisões dentro da equipe negociadora do governo Tsipras. O que tem de ser enfatizado é o facto de que nenhumas concessões foram aceites pelos credores em qualquer etapa das negociações.

Em Fevereiro, o antigo ministro das Finanças Varoufakis havia insinuado que a Grécia cumpriria suas obrigações de dívida mas não seria capaz de obedecer às drásticas medidas de austeridade exigidas pelos credores, incluindo despedimos maciços de empregados do sector público, reforma de pensões e segurança social, etc.

Estas reformas não exacerbarão apenas a crise económica e social, a resultante estagnação económica também contribuirá para aumentar a dívida soberana. E é disso que os credores estão à procura.

O desemprego segundo estatísticas oficiais é actualmente da ordem dos 26%. O desemprego juvenil está nos 50%. A taxa real de desemprego é significativamente maior do que o número publicado pelo governo.

Condicionalidades da dívida

O que deve ser entendido é que credores não estão necessariamente fixados no reembolso de dívida soberana. Muito pelo contrário. O seu objectivo é fazer a dívida avançar através do chamado reescalonamento de dívida, o qual basicamente lhes permite emprestar mais dinheiro ao devedor. A nova moeda facilita então o processo do serviço da dívida. "Nós lhe emprestaremos o dinheiro e com o dinheiro que lhe emprestámos você nos pagará de volta". Novos empréstimos reembolsam velhas dívidas.

Este procedimento tem sido aplicado rotineiramente durante mais de trinta anos como parte do programa de ajustamento estrutural (PAE) do FMI-Banco Mundial. O fardo da dívida ascende. O país fica cada vez mais num colete de força. Os credores dão as ordens sobre reformas macroeconómicas.

Quanto ao novo pedido de Tsipras, este é para a concessão de uma pacote de 53,5 mil milhões de euros, a maior parte do qual será utilizado para o serviço da dívida. A maior parte do dinheiro não entrará no país. Este dinheiro será concedido a credores da Grécia em troca de um dramático pacote de reformas.

Dívida em economia real

O que tem de ser tratado é o relacionamento entre a arrecadação de dívida em termos monetários e a economia real.

Os credores usarão os muitos milhares de milhões de obrigações de divida da Grécia como meios para impor reforma macroeconómicas mortais as quais servirão para desestabilizar a economia nacional e empobrecer ainda mais a população. Estas são mencionadas pelo FMI como "políticas de condicionalidade", as quais permitirão aos credores ditar o essencial da política económica e social.

Os credores estão muito interessados em adquirir riqueza real dentro da economia nacional, nomeadamente a aquisição de instituições bancárias nacionais da Grécia, suas empresas públicas, sua terra agrícola, etc.

As 13 página do documento de Tsipras soletram o desastre: um novo processo de empobrecimento, a tomada dos activos públicos e da infraestrutura do país, bancarrota de agricultores e pequenos negócios, o influxo de investidores estrangeiros que comprarão a riqueza do país a preços de saldo.

A substância da proposta de Tsipras foi endossada na sexta-feira 10 de Julho pelo parlamento grego numa votação de 251 a favor, 32 contra e 8 abstenções. Houve um movimento significativo contra a proposta vinda do Syriza.

O documento de 13 páginas que esboça propostas de reforma do governo e de austeridade destina-se a ser utilizado nas negociações com credores da Grécia durante o fim-de-semana.

O que está em causa no pacote de reformas proposto é um processo engendrado de empobrecimento, a morte de programas sociais e uma bancarrota de facto destinado a levar empresas nacionais e regionais à bancarrota.

A aceitação pela Grécia das exigências dos credores é o equivalente a abandonar a sua soberania como estado nação.

As consequências económicas e sociais provavelmente serão devastadoras.
11/Julho/2015
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

quarta-feira, julho 01, 2015

O ataque da Europa à democracia grega, por Joseph Stiglitz

Devemos ser claros: quase nenhum do enorme manancial de dinheiro emprestado à Grécia foi verdadeiramente para lá. Foi canalizado para pagar aos credores do setor privado – incluindo bancos alemães e franceses. O que a Grécia obteve foi uma ninharia, mas pagou um elevado preço para preservar os sistemas bancários desses países. Artigo de Joseph Stiglitz, Prémio Nobel da Economia.
Prémio Nobel da Economia Joseph Stigliz na Universidade de Columbia. Foto de Abhisit_Vejjajiva/Flickr
O crescimento exponencial de disputa e conflitualidade no seio da Europa pode parecer a quem está de fora como sendo o resultado inevitável do amargo fim do jogo entre a Grécia e os seus credores. Na verdade, os líderes europeus estão finalmente a revelar a verdadeira natureza da disputa da dívida em curso, e a resposta não é agradável: é sobre poder e democracia muito mais do que dinheiro e economia.
Claro, a política económica por detrás do programa que a troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional) tem impingido à Grécia há cinco anos tem sido abismal, resultando num declínio de 25% do PIB do país. Não consigo pensar em nenhuma depressão que alguma vez tenha sido tão deliberada e que tenha tido tais consequências catastróficas: a taxa de desemprego entre os jovens da Grécia, por exemplo, já ultrapassa os 60%.
É surpreendente que a troika se tenha recusado a aceitar a responsabilidade por alguma coisa destas ou admitir o quão maus tenham sido as suas previsões e modelos. Mas, o que é ainda mais surpreendente é que os líderes europeus não tenham sequer aprendido. A troika ainda exige que a Grécia alcance um excedente orçamental primário (excluindo o pagamento de juros) de 3,5% do PIB em 2018.
Economistas de todo o mundo condenaram essa meta como punitiva, porque exigi-la resultará inevitavelmente numa recessão mais profunda. Na verdade, mesmo que a dívida da Grécia seja reestruturada para além de qualquer coisa imaginável, o país permanecerá em depressão se os eleitores se comprometerem com a meta da troika no referendo, a ser realizado sob pressão este fim de semana.
No que respeita a transformar um grande défice primário num excedente, poucos países fizeram algo parecido com o que os gregos alcançaram nos últimos cinco anos. E, embora o custo em termos de sofrimento humano tenha sido extremamente elevado, as propostas recentes do governo grego fizeram um longo caminho para serem atendidas as exigências dos seus credores.
Devemos ser claros: quase nenhum do enorme manancial de dinheiro emprestado à Grécia foi verdadeiramente para lá. Foi canalizado para pagar aos credores do setor privado – incluindo bancos alemães e franceses. O que a Grécia obteve foi uma ninharia, mas pagou um elevado preço para preservar os sistemas bancários desses países. O FMI e os outros credores “oficiais” não precisam do dinheiro que está a ser exigido. Num cenário business-as-usual, o dinheiro recebido, provavelmente, serviria para ser novamente emprestado à Grécia.
Mas, novamente, o que interessa não é o dinheiro. É sobre usar "prazos" para forçar a Grécia a ceder e aceitar o inaceitável - não apenas medidas de austeridade, mas outras políticas regressivas e punitivas.
Mas por que é que a Europa está a fazer isto? Por que é que os líderes da União Europeia estão a resistir ao referendo e a recusar-se a estender, por alguns dias, o prazo de 30 de junho para o próximo pagamento da Grécia ao FMI? Não foi a Europa toda formada em cima da ideia da democracia?
Em janeiro, os cidadãos da Grécia votaram por um governo comprometido em acabar com a austeridade. Se o governo estivesse simplesmente a cumprir as suas promessas eleitorais, já teria rejeitado a proposta. Mas queria dar aos gregos uma hipótese para refletirem sobre esta questão, tão determinante para o bem-estar futuro do seu país.
Esta preocupação com a legitimidade popular é incompatível com a política da zona euro, que nunca foi um projeto muito democrático. A maioria dos seus governos não procurou aprovação do seu povo quando entregou a soberania monetária ao BCE. Quando a Suécia o fez, os suecos disseram não. Entenderam que o desemprego subiria se a política monetária do país fosse estabelecia por um banco central que incidisse única e exclusivamente sobre a inflação (e também que houvesse uma atenção insuficiente para com a estabilidade financeira). A economia sofreria, porque o modelo subjacente à zona euro se baseou em relações de poder desfavoráveis aos trabalhadores.
E, com certeza, o que estamos a ver agora, 16 anos após a zona euro ter institucionalizado essas relações, é a antítese da democracia: muitos líderes europeus querem ver o fim do governo de esquerda do primeiro-ministro Alexis Tsipras. Afinal de contas, é extremamente inconveniente ter na Grécia um governo que é tão contrário aos tipos de política que tanto fizeram para aumentar a desigualdade em muitos países avançados, e que é tão empenhado em reduzir o poder desenfreado da riqueza. Parecem acreditar que podem, eventualmente, derrubar o governo grego forçando-o a aceitar um acordo que viola o seu mandato.
É difícil aconselhar os gregos a como votar a 5 de julho. Nenhuma alternativa – aceitação ou rejeição dos termos da troika – vai ser fácil, e ambos carregam enormes riscos. Um voto sim significa depressão quase sem fim. Talvez um país empobrecido – que já vendeu todos os seus ativos e cujo povo jovem brilhante emigrou – poderá finalmente conseguir um perdão da dívida; talvez, depois de se ter transformado numa economia de rendimento médio, a Grécia poderá finalmente receber apoio do Banco Mundial. Tudo isto pode acontecer na próxima década, ou talvez na década seguinte.
Por contraste, um voto não abre, pelo menos, a possibilidade de a Grécia, com a sua forte tradição democrática, pegar no destino pelas suas próprias mãos. Os gregos poderão ganhar a oportunidade de moldar um futuro que, embora não tão próspero quanto o passado, é muito mais esperançoso que a inconcebível tortura do presente.
Eu sei como votaria.
Esquerda.net

“Chantagem financeira não pode substituir-se à democracia”

Bloco de Esquerda afixa outdoor diante do edifício do FMI, em Lisboa, para denunciar o papel das instituições financeiras que atacam e fazem chantagem à Grécia.
A Democracia contra o medo e a chantagem. Foto de Paulete Matos
A Democracia contra o medo e a chantagem. Foto de Paulete Matos
O Bloco de Esquerda afixou um outdoor em frente ao edifício do FMI, em Lisboa, com os dizeres: “A democracia contra o medo e a chantagem – Solidariedade Grécia”. No entender de Catarina Martins, porta-voz, do Bloco, “não podemos deixar que em nenhum lugar a chantagem das instituições financeiras se substitua à democracia”.
Cavaco Silva foi o único chefe de Estado europeu que falou na hipótese de a Grécia sair do euro.
A deputada denunciou que Portugal está numa situação particular, porque Cavaco Silva foi o único chefe de Estado europeu que falou na hipótese de a Grécia sair do euro.
“Isto é de uma irresponsabilidade e de uma leviandade que não pode ficar sem resposta. Quando Cavaco Silva diz que se a Grécia sair do euro, em vez de 19 ficam 18, está muito enganado”, recordando que uma eventual saída da Grécia colocará Portugal “na linha da frente do ataque dos especuladores, como diz toda a imprensa económica internacional”.
Esquerda.net