sábado, abril 08, 2017

O ALGARVE NO PARLAMENTO: Os pecados capitais do Governo PS no Algarve


 | JOÃO VASCONCELOS
O governo anterior do PSD/CDS, devido às suas políticas neoliberais austeritárias, às ordens da troika estrangeira, em “guerra permanente” contra os trabalhadores, os jovens, a terceira idade, contra as populações, quase iam destruindo o Algarve (e todo o país), cujas consequências negativas ainda hoje se fazem sentir. Por isso, a direita foi derrotada nas eleições legislativas e foi formado um novo governo, do PS, suportado pelos partidos da esquerda parlamentar, onde se inclui o Bloco de Esquerda.
Sem dúvida que se conseguiram vários avanços, várias medidas da troika foram revertidas, as famílias recuperaram alguns rendimentos, as privatizações cessaram e parou, até certo ponto, o ciclo de empobrecimento do país. Mas havia a esperança que este governo fosse mais longe – e tinha todas as condições para isso. No entanto, a desilusão começa a instalar-se.
Olhando para o Algarve, são quatro os pecados capitais que envolvem o atual governo. Neste artigo iremos falar apenas de dois desses pecados. No próximo artigo serão enunciados os outros dois.
Comecemos pelo Serviço Nacional de Saúde. O governo anterior, com a criação do Centro Hospitalar do Algarve, em 2013, à revelia de utentes, profissionais e populações, desferiu um dos maiores ataques a uma das maiores conquistas da Revolução de abril, o SNS. No Centro Hospitalar degradaram-se valências, serviços, faltaram medicamentos e material cirúrgicos e a norma passou a ser a carência grave de médicos, enfermeiros, técnicos e outros profissionais de saúde.
A constituição do Centro Hospitalar do Algarve revelou-se um erro crasso e só não foi mais grave devido aos protestos dos profissionais e das populações. Erro denunciado na altura pelo Bloco de Esquerda e que o atual Ministro da Saúde já reconheceu. Quem mais sofreu com esta situação foram os utentes que viram posto em causa um dos direitos básicos consagrados constitucionalmente – o direito à proteção na saúde.
O atual governo tomou algumas medidas para resolver a situação, todavia revelaram-se claramente insuficientes. Graves problemas continuam a afetar o CHA, com muita falta de médicos e outros profissionais, a produtividade decresceu, o recurso a privados tem aumentado, os tempos de espera para as consultas continuam longos, esperam-se muitas horas nas urgências, os investimentos tardam. O Centro de Medicina Física e de Reabilitação de S. Brás de Alportel funciona apenas a 50%.
Este é um dos erros capitais do atual governo no Algarve – ainda não deu a devida atenção ao SNS na região. Tem de resolver, quanto antes, as graves dificuldades que continuam a grassar no Centro Hospitalar e também a nível dos cuidados de saúde primários.
Um dos outros erros capitais do governo PS, e bem grande, prende-se com as portagens na Via do Infante. As portagens, impostas pelo anterior governo, têm provocado consequências trágicas na região. Além dos graves prejuízos provocados à economia e à mobilidade na região, a maior tragédia tem a ver com a dimensão dos acidentes rodoviários ocorridos, grande parte da EN125, uma “rua urbana” e que voltou a ser considerada a estrada mais mortífera do país, ou seja, a “estrada da morte”, devido às inúmeras vítimas mortais e feridos graves que têm acontecido.
Só no ano de 2016 tiveram lugar no Algarve mais de 10.000 acidentes rodoviários, mais precisamente 10.241 (grande parte na EN125)! O Distrito de Faro ficou em 4.º lugar a nível nacional, apenas sendo ultrapassado por Lisboa, Porto e Braga. No ano passado foram mais 751 acidentes do que em 2015 e mais 1.903 do que em 2014, com 31 vítimas mortais e 158 feridos graves.
Em 5 anos de portagens registaram-se na região cerca de 50.000 acidentes, com quase 200 vítimas mortais e quase 1.000 feridos graves, a maioria na EN125. Uma tragédia e uma espécie de “guerra não declarada” no Algarve! Certamente que nem todos os acidentes e vítimas se devem à introdução das portagens, mas uma grande percentagem desta injustiça e arbitrariedade resulta desse erro gritante que foi a imposição e portagens.
Toda esta vergonha e estes crimes acontecem na principal região turística do país, uma região sem vias alternativas, com uma EN125 longe de se encontrar totalmente requalificada (mesmo requalificada nunca será alternativa), e uma ferrovia regional mais própria do século XIX.
Por outro lado, o contrato com a PPP da Via do Infante continua a ser bastante ruinosa para o país, com um prejuízo anual acima dos 30 milhões de euros. Ainda não houve coragem para denunciar e tocar nos privilégios da concessionária, que continua a engordar. Em nome da transparência devem ser tornados públicos todos os interesses obscuros que envolvem essa PPP.
Perante a realidade de tais factos esperava-se que o governo do Partido Socialista fosse diferente do governo do PSD/CDS e abolisse as portagens no Algarve. Não só não acabou com as portagens, como os seus deputados votaram contra todas as propostas apresentadas na Assembleia da República para a sua eliminação. Nesta legislatura o Bloco de Esquerda já apresentou três vezes essa proposta (2 vezes na discussão dos Orçamentos de Estado e em maio de 2017). Também nesta matéria este governo revelou-se uma desilusão.
No próximo dia 30 de março será discutido no Parlamento mais um Projeto de Resolução do Bloco para a eliminação das portagens no Algarve. Os deputados do PSD, do CDS e do PS voltam a ter a oportunidade de acabar com a calamidade das portagens que grassam no Algarve há mais de 5 anos. E o PS tem a “chave do jogo nas mãos”, pois depende de si acabar com tal tragédia. Depois, se persistirem no erro, tanto uns e outros, não venham dizer que se sentem ofendidos se forem acusados de terem “as mãos sujas de sangue” das vítimas tombadas devido às portagens.
Será mais um erro capital deste governo se teimar em manter as portagens no Algarve. E certamente que a luta pela sua abolição irá continuar – já no dia 17 de abril, a partir das 15 horas, com uma marcha lenta de viaturas pela EN125, entre as Quatro Estradas (Quarteira) e Lagoa.
João Vasconcelos
*(Deputado do BE na Assembleia da República)

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