Autarcas vão liderar nova plataforma anti-portagens na Via do Infante
Vai
ser criada plataforma transversal à sociedade algarvia, que exigirá a
suspensão imediata da cobrança de portagens na Via do Infante, liderada
pela AMAL- Comunidade Intermunicipal do Algarve e que juntará entidades
públicas, associações empresariais e civis.
A primeira reunião desta estrutura ainda será marcada mas,
para já, ficou claro o «não às portagens» da parte das muitos
representantes de forças vivas da região, de empresários da vizinha
Andaluzia e dos cidadãos que participaram no II «Fórum
Algarve/Andaluzia», que decorreu este sábado, em Loulé.
Uma medida que a Comissão de Utentes da Via do Infante, que organizou
o evento em parceria com a Câmara de Loulé, considera como um avanço na
luta contra a cobrança de taxas na A22, que tem levado a cabo com muita
intensidade (mas nem sempre com muita adesão) nos últimos dois anos.
«Sempre defendemos que deveria haver um consenso o mais alargado
possível, que fosse além das orientações político partidárias», disse
João Vasconcelos, membro da CUVI e vereador da Câmara de Portimão pelo
Bloco de Esquerda. A CUVI sempre funcionou nesse registo, garantiu, uma
vez que tem membros «de todos os partidos, desde o BE ao CDS/PP», para
além de outros sem filiação partidária.
Foi
João Vasconcelos quem desafiou o presidente da AMAL Jorge Botelho a ser
o rosto desta luta, a partir de agora e a conduzir o processo de
criação da plataforma. Um repto aceite pelo autarca tavirense, que não
escondeu que, na sua visão, não há lugar para portagens na Via do
Infante.
«Depois de um debate muito alargado, há duas conclusões que podemos
tirar. Primeiro: o processo não é contra ninguém, mas sim a favor da
suspensão ou abolição das portagens na Via do Infante e da
requalificação da EN 125. Segunda nota: esta não é uma questão de
interesses político-partidários ou privados, é a favor do Algarve»,
frisou Jorge Botelho.
«Nós, enquanto autarcas, consideramos que terá de haver um retomar
deste processo, porque a avaliação da introdução portagens na Via do
Infante está a revelar-se um desastre, tanto económico, como para a
mobilidade, com perspetivas desastrosas para o setor turístico e para o
comércio transfronteiriço», considerou o presidente da AMAL, à margem da
sessão.
Durante a sua intervenção, como membro da mesa deste Fórum, Jorge
Botelho já havia defendido que «o que o Governo fez foi uma traição ao
Algarve», por ter colocadoportagens na A22, quando havia garantido aos
autarcas da região que isso só aconteceria depois de a EN 125 ser
requalificada.
A
AMAL e a Região de Turismo do Algarve foram duas das entidades
presentes e que também já tinham estado num primeiro encontro entre
entidades dos dois lados da fronteira, mas, desta vez, houve uma adesão
bem significativa.
Além de muitos autarcas, a larga maioria do PS, mas também Francisco
Amaral, do PSD, notou-se a presença dos deputados à Assembleia da
República Cecília Honório (BE) e Miguel Freitas (PS) e de representantes
de associações empresariais, nomeadamente Vítor Neto da Associação de
Empresários da Região do Algarve, cujas instalações acolheram o evento e
Armando Santana, da Associação de Empresas Rent-a-Car do Algarve.
O ex-reitor da universidade do Algarve Adriano Pimpão, o antigo
presidente da Câmara da Câmara de Faro José Vitorino e, claro, o
convidado de honra, vice-presidente da Associação Transparência e
Integridade Paulo de Morais também estiveram presentes e contribuíram
para o debate.
Apesar de estilos diferentes, a visão sobre a cobrança de portagens
na Via do Infante e as consequências que esta tem para o Algarve
mereceram consenso. Também a exigência da sua suspensão (muitos pediram,
ainda, a abolição permanente) foi defendida por todos os intervenientes
e oficializada num manifesto lido pelo presidente da Câmara de Loulé
Vítor Aleixo no final do encontro e que foi dado a assinar aos
presentes.
Neste são defendidos os argumentos que têm vindo a ser utilizados ao
longo dos últimos dois anos, por diversos intervenientes, que passam,
desde logo, pelos prejuízos que a Via do Infante continua a dar ao
Governo, apesar das portagens, que, no terceiro trimestre de 2013,
ascendiam a mais de 21 milhões de euros. O aumento da insegurança na EN
125 e os efeitos nefastos para o setor turístico e para a capacidade de
atração do mercado de proximidade espanhol e andaluz, são outros
argumentos apresentados.
Via do Infante é uma «PPP ruinosa» e não é a única
A
intervenção de Paulo de Morais, como acabou por se perceber na fase em
que o público foi chamado a participar, era das mais esperadas da tarde e
foi um dos fatores que ajudou a encher o auditório do NERA. O
vice-presidente da Associação Transparência e Integridade fez uma
apresentação, no mínimo, inquietante, sobre os contornos das Parcerias
Público Privadas rodoviárias, que continuam, em muitos casos, envolvidas
em grande secretismo.
Não será para menos, tendo em conta os números apresentados por Paulo
de Morais, que indiciam, desde logo, um péssimo negócio para o erário
público, que custará aos cofres do estado, em 2014, qualquer coisa como
«4 mil milhões de euros» e continuará a ter um enorme peso nas contas
públicas nos próximos 20 anos.
A Via do Infante é apenas mais um caso, e nem é o mais grave. O custo
anual para o Estado é de 40 milhões e, para Paulo de Morais, a solução
era bem simples. «Se dessem aos bancos menos 1/400 avos do que deram,
tinham os 40 milhões necessários para pagar a Via do Infante», defendeu.
Por outro lado, defende, ao colocar portagens na ex-SCUT, o Governo
motivou uma diminuição de tráfego – que atingiu os 50 por cento na A22 –
e levou a que o consumo de combustíveis baixasse. «Tendo em conta que
metade do que se paga por um litro de combustível é imposto, o Governo
perdeu, em 2012, muito mais dinheiro em Imposto Sobre os Produtos
Petrolíferos do que aquilo que ganhou em portagens», assegurou.
Também a cobrança pelo sistema de pórticos representa uma despesa
que, no Algarve, atinge 29 por cento do valor que é cobrado ao cidadão,
chegando a ser metade noutros pontos do país. «É como se, num hotel,
metade do valor da conta fosse o custo da fatura», exemplificou.
A
intervenção de Paulo de Morais foi muito focada nas PPP rodoviárias e
na alegada corrupção que motivam. Os números apresentados são «todos
reais» e retirados da pouca documentação disponível, uma vez que a
informação sobre os negócios das PPP rodoviárias «é constantemente
sonegada».
Dados que apontam para que o Estado português pague rendas
desajustadas e bem acima do custo do serviço e que os contratos integram
cláusulas que retiram todo o risco do negócio do setor privado e o
colocam exclusivamente do lado do setor público. Algo que está longe de
ser uma novidade, mas que a Associação Transparência e Integridade faz
questão de lembrar.
O que não será do conhecimento geral é que haverá várias soluções
para acabar com esta situação, embora, até agora, o Governo apenas tenha
«renegociado PPP cujas obras ainda não começaram ou estão no início».
Os negócios mais onerosos mantém-se intactos, mas não tem de ser assim.
Paulo de Morais sugere, desde logo, que se proponha aos
concessionários baixar drasticamente as rendas. «Se lhes oferecerem
metade do que ganham agora, eles aceitam à mesma e continuam a ter
lucro», assegurou.
E por que razão alguém aceitaria receber metade, quando pode receber
tudo? Porque, disse Paulo de Morais, o Estado tem instrumentos mais
agressivos ao seu dispor e até poderá ter vantagem em usá-los, em alguns
casos. «Se a concessão da Ponte Vasco da Gama fosse expropriada pelo
seu valor, o Estado não teria de pagar nada e se calhar até recebia
algum dinheiro da Lusoponte, porque a obra está mais que paga»,
assegurou.
Outra
possibilidade é, simplesmente, denunciar os contratos, porque, segundo
garante o ativista anti-corrupção, eles estão feridos de ilegalidade,
por diversas razões.
Uma intervenção que gerou reações fortes vindas da assistência,
incluindo uma do presidente da Câmara de Olhão António Pina, no mínimo,
inesperada. «Estava aqui a ouvir o Dr. Paulo Morais e a pensar numa
coisa e se a dizia ou não dizia…». E disse: «Há uns filhos da puta que
nos andam a roubar!».
António Pina pediu a Paulo de Morais que resumisse a denúncia que fez
em Loulé num texto conciso e comprometeu-se a «enviar essa carta junto
da conta da água aos munícipes» de Olhão. «Olhe que eles assim já não
pagam», brincou o vice-presidente da Associação Transparência e
Integridade.