O clube de fanáticos |
Ficámos
a saber, na semana que passou, que um grupo de 400 fanáticos
organizados, há mais de um ano, decidiu formar uma associação,
autointitulada como independente, que tem como mote o memorando da
troika ser “curto” e não passar de um “plano de contingência”, daí ser
necessário ir mais longe.
Artigo de Fabian Figueiredo
Resumidamente é este o cartão-de-visita da Plataforma para o Crescimento Sustentável(1),
que das ideias às vontades é o disco de platina da direita política e
ideológica, não fosse ela presidida pelo vice-presidente do PSD, Jorge
Moreira da Silva.
No plano do papel e das funções do Estado as intenções
são inovadores desde o apogeu do liberalismo: quanto menos melhor,
desde que garanta a ordem pública, a igualdade de oportunidades e a
mobilidade social. Para a coisa ficar mais composta juntam-lhe uma
panóplia de sugestões democráticas, das quais assinalo duas, os
círculos uninominais e reforço do mérito e da transparência nos
partidos. A primeira vem sob o embrulho de “alterações ao sistema
eleitoral que aproxime o cidadão dos seus representantes”. A segunda,
através do aumento da “transparência e reconhecimento do mérito”.
Miguel Relvas, com o mérito que se lhe conhece e a transparência que
marca o seu percurso político-partidário, pode ficar descansado que
continuaria a ser eleito. A democracia como regime, que garante a
representação plural das expressões e vontades sociais, é que saia
amputada. Fica uma vez mais claro que um two party system à portuguesa é um desejo cada vez mais visível do centrão.
O programa de intenções vai ainda mais longe, quando olhamos para os campos da Saúde, Trabalho e Segurança-Social.
O Serviço Nacional de Saúde é para acabar, apesar de não
ser afirmado nitidamente, com o signo de uma cidadania livre é
proposto que deve ser “inclusivo e financeiramente sustentável, num
quadro de escolha e concorrência” e o acesso universal através “de uma
política de preços que estimule a competitividade entre prestadores
independentemente da sua natureza pública, privada ou social”. Por
outras palavras, dois sistemas de saúde, um para ricos, outro para
pobres, a qualidade dos serviços passariam a ser definidos pelo extrato
da conta.
As demais funções sociais do Estado seriam transferidas
para organizações de voluntariado, pois “estão em condições de prestar
muitos serviços públicos, com maior qualidade e eficiência do que o
Estado”. Sim, Isabel Jonet é uma das destacadas figuras do think thank.
Para o flagelo do desemprego, a resposta não podia ser
mais óbvia, mais precariedade, insegurança no trabalho e desvalorização
salarial: “absolutamente urgente criar as condições para aumentar o
emprego, num contexto de maior diversidade e flexibilidade nos regimes
de contratação e de formação (…) é fundamental diminuir os custos de
indemnizações por cessação de contrato de trabalho sem termo.”2
Quando é afirmado ad eternum, que o memorando
da troika é uma oportunidade única para o país, sabemos bem porquê, sem
a força violenta da intervenção externa e o subsequente apoio das
instituições financeiras, a direita e a elite económica nacionais nunca
conseguiriam num tão curto espaço de tempo, propor um novo contrato
social leonino e serem tão honestos na vontade de fazer letra morta da
Constituição da República Portuguesa.
Independentemente da concretização, ou não, da
totalidade das vontades expressas por este clube de 400 fanáticos, o
atrevimento propositivo, que se pode singularizar no fim de todo e
qualquer sufixo social na palavra Estado, demonstram a crueldade do
programa da “refundação do estado”, como a ganância do capital é
ilimitada, sempre com as melhores intenções – pois claro (!) – e como
os tempos que vivemos são encarados como oportunidade única pela classe
dominante. Infelizmente uma parte substantiva do espírito das
intenções descritas já ganharam corpo legislativo, a diferença entre os
últimos dois OE’s e as vontades da plataforma, é uma questão de
distância, o caminho é exatamente o mesmo.
A direita não tem outro projeto para o país, que não
passe pela privatização de tudo o que é público e a aniquilação de
todos os direitos sociais. Felizmente, como a história recente nos tem
demonstrado, o tabuleiro de xadrez não tem só um lado. Chegará a nossa
altura para o xeque-mate, com uma diferença, à esquerda as jogadas
fazem-se em nome de mais democracia, serviços públicos, igualdade,
liberdade, solidariedade e prosperidade coletiva.
1
Para além da Plataforma para o Crescimento Económica Sustentável ser
presidida por Jorge Moreira da Silva, conta com a presença de Francisco
Pinto Balsemão, Ângelo Correia, Carlos Pimenta, Rui Machete, António
Monteiro, Arlindo Cunha, Belmiro de Azevedo, Carlos Carreiras, Fernando
Nogueira, Isabel Jonet, Manuel Meirinho, Pedro Lopes Marques, Teresa
Gouveia e Vítor Bento.
2 Fontes: Jornal Público, edição em papel, Quinta 13 Dezembro 2012, pág. 3-4 ; crescimentosustentavel.org
A Comuna |
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