O estilo “pato bravo” na democracia local |
Um
“pato bravo” é sempre um “pato bravo”. Na construção civil, nos
negócios ou na política, a marca é indelével. Os interesses próprios
são, obviamente, a prioridade. A ganância pelo lucro imediato -
aproveitar enquanto está a dar - sobrepõem-se a tudo o resto.
Artigo de Pedro Soares
Normas urbanísticas, espaços verdes, cultura
arquitetónica, respeito pelo património comum, interesse público… para
quê?! O importante é o mamarracho, desde que permita um bom negócio,
engordar a conta bancária, manter o mercedes, comprar a pulseira de
ouro e ostentar um grande rolex.
Com a crise da construção civil, o ministro Relvas
tornou-se o espécime mais evidente do estilo “pato bravo” na política.
Democracia, participação, identidade, cultura, desenvolvimento
sustentável, respeito pelas populações… para quê?! O importante é a
estabilidade do caciquismo local e o controlo dos negócios, legitimados
com uma macaqueação da democracia. É a isso que se chama eficiência e
pragmatismo na gestão dos dinheiros públicos.
Um verdadeiro monumento ao “patobravismo” é a mais
recente proposta de lei do ministro Relvas, sobre o regime jurídico das
autarquias e o estatuto das entidades intermunicipais, aprovada pela
maioria governamental.
Mais poderes para os presidentes de Câmara e menos para
as Assembleias Municipais, é a filosofia geral. Até o direito de
apresentação de moção de censura ao executivo, mesmo que sem grandes
consequências, é retirado.
Com a esperteza habitual e a subtileza do hipopótamo,
Relvas anuncia a eliminação de alguns dirigentes e assessores nas
Câmaras, mas cria um aparelho de secretários executivos, talhado para
albergar autarcas da maioria em fim de carreira, nas CIM – Comunidades
Intermunicipais e nas Áreas Metropolitanas, para onde são canalizadas
competências centrais e municipais, sem qualquer controlo democrático.
A falta de vergonha chega ao ponto de estabelecer uma
norma na lei que só quem pode propor a lista de secretários executivos,
para cada uma destas entidades intermunicipais, é o presidente da
Assembleia Municipal com maior número de mandatos atribuídos ao partido
ou coligação maioritária na respetiva área intermunicipal ou
metropolitana. Ou seja, é o cacique-mor do partido maioritário na
região que vai distribuir aqueles lugares, ponto final.
Depois, tudo será legitimado por um arremedo de eleição,
através de um colégio eleitoral constituído por um número limitado de
membros das assembleias municipais, onde só estarão os partidos
maioritários. Nunca tal tinha acontecido em Portugal após o 25 de
Abril.
As assembleias intermunicipais e metropolitanas, onde
até agora têm participado deputados municipais eleitos nas respetivas
assembleias, desaparecem com a nova lei. Serão substituídas por
Conselhos Intermunicipais ou Metropolitanos, apenas compostos pelos
presidentes de Câmara que veem, assim, os seus poderes reforçados e
alcandorados para lá dos respetivos municípios onde são eleitos. Mais
uma vez as assembleias são desvalorizadas em detrimento dos poderes
presidenciais.
Esta lei transforma a democracia representativa e
plural, numa espécie de “democracia só para a maioria”. Aniquila o
processo de regionalização e de descentralização administrativa. Afasta
os eleitores dos detentores de cargos políticos e da decisão política.
Agrava a falta de transparência, diminui a cidadania, a pluralidade
política e as oposições, potencia a corrupção e o clientelismo. É uma
vergonha para a democracia local. Como acontece com qualquer “pato
bravo”, estão a aproveitar enquanto dá.
A Comuna
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