sexta-feira, junho 21, 2013

Brasil comemora vitória das mobilizações e redução das tarifas de transportes

Depois de duas semanas de protestos, o prefeito de S. Paulo, Fernando Haddad, do PT e o governador Geraldo Alckmin, do PSDB, encurralados, anunciam que os aumentos decretados em 1 de junho são anulados. Líderes do Movimento Passe Livre comemoram a vitória, mas mantêm a manifestação desta quinta.
A Rua encurralou os governantes. Foto de Drago/SelvaSP
O Brasil comemora esta quinta-feira a primeira grande vitória do movimento que levou, em duas semanas, centenas de milhares de pessoas às ruas, e que arrancou a redução dos preços das tarifas de transportes na tarde desta quarta, quando, encostados à parede pelo movimento, o prefeito e o governador de São Paulo anunciaram o recuo. Em S. Paulo, assim, o preço da tarifa de ônibus (autocarro) e metrô voltam a ser 3 reais, e não os 3,20 reais que vigoravam desde o início deste mês.
Como um dominó em queda, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Pais, anunciou o recuo das tarifas na cidade (de 2,95 reais dos ônibus para 2,75, de absurdos 3,50 reais para igualmente absurdos 3,20 do metrô, e de inacreditáveis 4,80 reais das barcas Rio-Niterói para 4,50), no que foi seguido pelo prefeito de Niterói, os de muitas cidades do interior do Rio e de S. Paulo e de todo o país. Note-se que até à decisão renitente das autoridades paulistas, onze cidades já tinham decidido reduzir as tarifas.
Dirigentes dizem que a luta agora é pela tarifa zero
A notícia foi recebida pelos dirigentes do Movimento Passe Livre (MPL) que originou os protestos em S. Paulo, cantando “A Internacional”, hino internacional dos Trabalhadores, segundo o site do jornal Folha de S. Paulo.
Ouvidos por aquele jornal, os dirigentes do MPL disseram que está mantida a manifestação esta sexta às 17h na avenida Paulista – que se tornará sem dúvida numa enorme comemoração de vitória – e que o movimento não vai parar, levantando a bandeira da tarifa zero, idealizada por um assessor da primeira prefeita do PT da cidade de S. Paulo, Luíza Erundina, e depois abandonada. Outras reivindicações do movimento são “lutar pelas reformas agrária e urbana e contra o latifúndio urbano”, disse uma dirigente do movimento, e “lutar para que nenhum manifestante [que tenha sido detido] responda a processo criminal”.
Outro dirigente sublinhou: “Cada um que compareceu a alguma das manifestações pode pegar uma pena e escrever seu nome na história”.
Mobilizações encurralaram governantes do PSDB e do PT
Alckmin e Haddad poderiam ter evitado muitos dissabores se tivessem tomado a medida que aprecia óbvia mais cedo que tarde. Mas não: adiaram-na até o último momento, na esperança de que as mobilizações se reduzissem e as pessoas se cansassem depois das grandes mobilizações de segunda-feira.
Mas não foi o que aconteceu. Em S. Paulo, a mobilização de terça-feira não terá tido as cem mil pessoas que teve segunda, mas pelo menos umas 80 mil se mobilizaram. E, na quarta-feira, foi a vez de a periferia da megalópole paulista se mobilizar, convocada pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto e pelo Movimento Periferia Ativa. Os habitantes de bairros mais pobres da capital paulista bloquearam a via Anchieta (que liga S. Paulo a Santos) por duas vezes nos dois sentidos, bloquearam a Rodovia Regis Bitencourt (que liga São Paulo à fronteira entre o Paraná e Santa Catarina), e outras artérias importantes como a Estrada do Campo Limpo, a Avenida Francisco Morato, a Estrada do M'Boi Mirim, ocupação dos terminais de ônibus de Guarapiranga e Jardim Angela, bloqueio da Ponte do Socorro (Marginal Pinheiros), e mais uma dezena de concentrações.
Houve igualmente mobilizações em cidades dos arredores de S. Paulo, como como Osasco, Santo André e Taboão da Serra, que há anos não se mobilizavam.
As reivindicações eram:
- Redução imediata das tarifas de ônibus municipal, intermunicipal, metrô e trem (comboio) metropolitano.
- Não ao gasto de dinheiro público e não aos despejos relacionados à Copa 2014
- Fora Fifa!
- Medidas do governo de controlo do valor das rendas de casa, vinculando-os ao índice de inflação.
- Por serviços públicos de qualidade na periferia.
Haddad tentou até o último minuto que o governo federal lhe subsidiasse o recuo, sem conseguir. Quando a imprensa tornou pública a recusa do ministro das Finanças, Guido Mantega, o prefeito de S. Paulo desistiu e combinou a conferência de imprensa com o governador Alckmin.
Outras mobilizações no país
Na mesma quarta-feira, em Fortaleza, a tropa de choque isolou uma área de três quilómetros da Arena Castelão, o estádio onde se realizou o jogo entre Brasil e México para a Copa das Confederações. Mais de 25 mil pessoas manifestaram-se contra os gastos excessivos nas obras para o Mundial de Futebol, que contrastam com a falta de investimentos em saúde e educação e a corrupção que fez os gastos da construção dispararem. Um cartaz levado pelos manifestantes dizia: “Este protesto não é contra a seleção, mas sim contra a corrupção! #ogiganteacordou”.
Houve confrontos com a polícia e manifestantes foram presos.
Em São Luís, capital do estado do Maranhão e “feudo” da família do ex-presidente Sarney, cerca de 15 mil pessoas foram às ruas e manifestaram-se durante três horas. No final, uma minoria de manifestantes tentou invadir o Palácio dos Leões e entrou em confronto com a polícia.
Em Niterói, cidade-dormitório do Rio de Janeiro, a manifestação de cerca de 10 mil durou sete horas e chegou a cortar o trânsito na ponte Rio-Niterói, mesmo depois de chegar a notícia da redução das tarifas.
Para esta quinta-feira 20, estão ainda marcados protestos em mais de 120 cidades brasileiras.
Uma luta por direitos
Mas mesmo nas cidades onde as tarifas foram reduzidas ainda há muito para lutar, porque prefeitos como Haddad (S. Paulo) ou Eduardo Paes (Rio de Janeiro) anunciaram a intenção de compensar as verbas envolvidas com cortes em áreas sociais, como saúde ou educação. "O prefeito anunciou que vai reduzir o valor da passagem tirando esse dinheiro, provavelmente, da área da Saúde”, reagiu o deputado estadual Marcelo Freixo, do PSOL do Rio de Janeiro, afirmando que isso é inaceitável.
“A população quer que a passagem seja mais barata retirando do enorme lucro que esses empresários têm. Queremos saber quanto custa essa passagem. Será que o passageiro está pagando mais do que as empresas? Ninguém sabe, porque o prefeito nunca mostrou essa planilha detalhada”, denunciou, acrescentando que “A população está exigindo Saúde no padrão Fifa, se retirar da Saúde para pagar empresário de ônibus não vai resolver o problema. A população vai continuar na rua, porque essa luta não é por 20 centavos. É uma luta por direitos".
Só a luta dos de baixo pode derrotar os interesses impostos de cima
O Movimento Passe Livre, entretanto, divulgou nota breve em que assegura que a luta vai continuar:
“A cidade não esquecerá o que viveu nas últimas semanas. Aprendemos que só a luta dos de baixo pode derrotar os interesses impostos de cima. A intransigência dos governantes teve de ceder às ruas tomadas, às barricadas e à revolta da população.
Não foi o Movimento Passe Livre, nem nenhuma outra organização, que barrou o aumento. Foi o povo.
O povo constrói e faz a cidade funcionar a cada dia. Mas não tem direito de usufruir dela, porque o transporte custa caro. A derrubada do aumento é um passo importante para a retomada e a transformação dessa cidade pelos de baixo.
A caminhada do Movimento Passe Livre, que não começa nem termina hoje, continua rumo a um transporte público sem tarifa, onde as decisões são tomadas pelos usuários e não pelos políticos e pelos empresários. Se antes eles diziam que baixar a passagem era impossível, a revolta do povo provou que não é. Se agora eles dizem que a tarifa zero é impossível, nossa luta provará que eles estão errados”.
Esquerda.net

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