terça-feira, agosto 31, 2010

Crónicas sobre Paris

Os roma - uma pedra no sapato de Sarkozy
Depois de visitar Paris durante o dia, à noite não dispensava os noticiários na TV francesa (domino de forma razoável a língua francesa). Em todos os canais as primeiras notícias incidiam sobre os roma - os ciganos romenos que Sarkozy e o seu governo odeiam e que não param de expulsar para a Roménia, país de origem desta etnia. As imagens eram bem elucidativas: acampamentos formados por dezenas de caravanas e toscas barracas e tendas, onde muitas famílias - com muitas crianças - ali se amontoavam, em condições extremamente parcas e a passar fome. Notavam-se muitas destas pessoas revoltadas, pois não compreendiam a sua expulsão de um país que tinham procurado para terem uma vida mais digna. Lá se viam também muitos polícias a invadir os acampamentos e que tinham ordens para expulsar estes imigrantes que ninguém quer.
A televisão mostrava igualmente o gabinete francês reunido de emergência no Eliseu, com Sarkozy em pose circunspecta, tão ciente da sua "nobre missão" (expulsar a canalha cigana, uma cambada de malfeitores e de ladrões) e o ministro dos Negócios Estrangeiros, Bernard Kouchner - o tal "humanista" fundador dos Médicos sem Fronteiras, a dizer, alto e bom som, "que ninguém se devia aproveitar da situação dos roma". Que hipocrisia sem limites!
Sem sombra de dúvida que o governo direitista de Sarkozy (filho de imigrantes húngaros), está a praticar uma política discriminatória e de segregação em relação aos ciganos romenos, que viola flagrantemente os direitos humanos. São já milhares os expulsos, cerca de 15 mil! Se a Roménia faz parte da União Europeia, então os seus habitantes, incluindo os de etnia cigana (como de qualquer outro país da UE), também são cidadãos europeus.
Na UE existem cerca de 10 milhões de pessoas de etnia cigana. Que fazer então com eles? eis a questão! Não será expulsando-os, diabolizando-os, tratá-los todos como salteadores e criminosos que se resolverá o problema. É verdade que os ciganos são muito difíceis de integrar. No entanto, não têm sido adoptadas políticas adequadas à sua integração, inclusive no nosso país. E em épocas de crise - provocada pela burguesia e pelo capitalismo selvagem - esta gente torna-se em bodes expiatórios e em alvos a abater. Já Hitler exterminou meio milhão de ciganos e seis milhões de judeus nas câmaras da morte do holocausto nazi que, curiosamente, alguns negam. Como muito bem escreveu Daniel Oliveira no Expresso, "em tempo de crise há que encontrar alvos fáceis. E eles tanto podem ser ciganos, ou imigrantes ou apenas os mais pobres dos mais pobres. É dos livros: atiçando o povo contra os desgraçados se salvam os poderosos". É o que está a fazer Sarkozy em relação aos ciganos romenos e búlgaros - uma autêntica pedra no seu sapato, pois parece que, afinal, o assunto não está a correr-lhe de feição. E toda a direita e extrema-direita europeia está a tocar o mesmo diapasão - vejam-se as propostas mais recentes do "Paulinho das Feiras" em matéria de segurança.
Gostei de Paris e da França - cidade e país do iluminismo, da revolução, de grandes escritores, como Zola, Balzac ou Vítor Hugo, dos bons cinemas e teatros, da boa gastronomia... mas senti-me verdadeiramente incomodado e enojado sempre que ouvia as notícias na TV gaulesa. Espero que não me aconteça o mesmo em Portugal.
João Vasconcelos






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