Sair do euro? |
Vários economistas de esquerda sinalizaram respostas à crise política/económica, em particular publicadas nos blogues Arrastão e Ladrões de Bicicletas. Em tempos de pensamento único é positivo que surja quem procure caminhos e soluções novas; ao fazê-lo estimulam o debate geral e isso motiva-me a umas singelas notas. No artigo «Salvar o euro – iv – propostas e cenários» (publicado aqui), Nuno Teles introduz a ideia de que «é necessário pois pensar numa possível estratégia imediata de reestruturação da dívida e consequente quebra do tabu nacional de que está envolto o debate sobre a saída do euro». Não vou replicar os correctos argumentos aludidos na resolução da Comissão Política do BE, nem outros que polemizam outras hipóteses e colocam inclusive a relação com o Tratado de Lisboa (publicado aqui) mas cingir-me a uma questão única: a «quebra do tabu nacional». A União Europeia corresponde a um novo estádio no desenvolvimento imperialista. Sendo parte do imperialismo global, ela concentra em si uma significativa alteração da relação entre os Estados e do papel do Estado-nação: mercado aberto, emissão e controlo da moeda e das políticas monetárias, decisão política cada vez maior, legislação europeia e poderes europeus, linhas ideológicas comuns através de um Tratado Constitucional reaccionário e alguns avanços na política militar comum. Com a crise económica o “directório burguês” pariu uma nova e grave inovação: o pré-controlo europeu aos orçamentos nacionais – mesmo antes de serem votados pelos respectivos parlamentos – e a possibilidade da pós-alteração dos orçamentos pela mão da decisão maioritária do Conselho de Ministros das Finanças. Com a crise o capitalismo acentuou a financeirização, a subordinação dos Estados e dos povos ao capital especulativo, o fundamentalismo neoliberal. Isto retira qualquer espaço a veleidades nacionalistas de países subalternos. Todo este caminho teve uma construção coerente: a negação da participação e da informação popular, a negação da democracia, o controlo férreo da decisão, a centralização do poder e da burocracia na Europa. Se havia necessidade de encontrar exemplos práticos do que é uma democracia burguesa eles aqui estão. Acresce que o lugar da burguesia portuguesa, o lugar de Portugal na divisão europeia do trabalho é o lugar subalterno. A nossa burguesia é parasitária, suga permanentemente o Estado enquanto o acusa de “gordo”, sobrevive da sobre-exploração da classe trabalhadora, da mafiosa fuga fiscal, da destruição ambiental e da ânsia na atracção de capital estrangeiro. É a partir daqui que ela se situa na relação com as outras burguesias europeias. A nossa burguesia não tem um Plano Nacional Desenvolvimentista, como a brasileira, que atraia para si aqueles que caem na ilusão de que esse Plano corresponde a uma ruptura – ou pelo menos uma contradição - com o imperialismo. Tão pouco tem um caminho de modernização social e industrial que tente juntar patrões e sindicalistas no “desígnio nacional”. A nossa burguesia também não tem as contradições patentes em Espanha. Como todos sabem, o nosso modelo de desenvolvimento é assente nos baixos salários, na precariedade e na proletarização de camadas cada vez mais vastas, porque é assim que as elites sempre quiseram. Já era assim no tempo do Estado Novo. Por outro lado. A população encontra-se submetida à chantagem e ao medo, despolitizada e até acreditando na permanente lavagem cerebral que lhe está a ser feita diariamente. É preciso ir sempre socavando o poder com propostas alternativas credíveis que abram espaço na mente das pessoas e ajudem a acumular forças. Em consequência (e com todo o respeito por opiniões diferentes): acreditar em saídas nacionalistas para a crise é olhar para a economia isolada da vida concreta das pessoas e das classes; acreditar em saídas nacionalistas seria acreditar que Sócrates teria alguma possibilidade de divergência com Merkel e Sarkozy. O assunto merece reflexão, porque independentemente de possíveis boas intenções há o risco de se cair no sofismo. De modo idêntico: acreditar em revisões do Tratado de Lisboa, para o tornar mais democrático, ainda por cima no momento de maior acirramento anti-democrático, é acreditar que a Merkel pode um dia acordar com um peso na consciência. Ainda mais quando a Alemanha quer assumir o seu papel de “Presidente da Secção Europeia do Conselho de Administração do Imperialismo». Assim: as alternativas da esquerda em Portugal só podem ser construídas no caminho da construção da alternativa europeia. Anti-capitalista, é certo; plural, é certo; que procura juntar forças, é certo; que procura o apoio das massas a partir do seu estádio de compreensão, é certo; que não se demite do combate e da disputa por mais difícil que ele pareça, pois procura em cada momento elementos de contra-ataque ao poder instalado. E especulando, a saída de Portugal do euro poderá até vir a ser uma exigência de Merkel – mas isso talvez significasse uma crise europeia tal que existiria uma enorme clivagem inter-burguesa, inter-europeia e inter-nacional, uma enorme dificuldade do poder alemão em suster movimentos de contestação sociais... Aliás o desigual desenvolvimento económico e político é uma lei absoluta do capitalismo. Victor Franco In A Comuna |
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