O PECado mora ao lado |
Passou em branco na maior parte dos jornais portugueses a reforma laboral que o PSOE fez recentemente aprovar em Espanha e que está a incendiar sindicatos e movimentos de trabalhadores. Artigo de Joana Mortágua Num dos países mais atingidos pelos efeitos da crise, em que o desemprego atinge 20% da população, foi o próprio partido socialista espanhol – junto a quem Sócrates anunciou o tango português - que bateu o pé pelos interesses dos mercados financeiros, do patronato e dos grandes grupos económicos. Falhada a negociação em sede de concertação social, o governo espanhol impôs à força, e por decreto, uma das alterações mais proclamadas pelos mercados nos últimos tempos: a liberalização dos despedimentos. Esta lei vem consagrar o chamado despedimento preventivo, popularizado em Portugal por Américo Amorim, permitindo ao empregador despedir sem justa causa, bastando-lhe para isso alegar “perdas actuais ou previstas” ou “diminuição de lucros”. Ao desempregado toca-lhe 20 dias de indemnização por cada ano trabalhado, num máximo de doze prestações. Há três meses atrás, em Portugal, um artigo do Expresso dava-nos conta das ideias de Pedro Portugal sobre o mercado trabalho. O economista resumia desta forma a solução para os problemas do mercado de trabalho português: mexer nos contratos de trabalho e regime de despedimentos, nos mecanismos de negociação de salários e nos subsídios de desemprego. Sobre esta última ideia, o artigo era claro: em Portugal não há demasiados desempregados, apenas desempregados há demasiado tempo. Segundo ele, a razão deste problema reside na “insensatez” da “arquitectura do sistema de subsídios de desemprego”, que padece de generosidade a mais. Escusado será dizer que demasiado generosa é a desonestidade intelectual que qualquer economista incapaz de reconhecer que o desemprego se tem revelado uma característica estrutural das economias capitalistas, agravada em Portugal pelo peso da crise. É importante estarmos atentos a estes opinion makers que aparecem sempre a horas certas, a preparar e experimentar a opinião pública para todas as reformas que, meses depois, nos caem nas costas. Com esse olhar mais desperto facilmente compreendemos que a sequência de PEC’s e medidas de austeridade não se justifica pela necessidade de ir respondendo, passo a passo, às debilidades da crise, mas corresponde à concretização de um projecto delineado, estudado e pensado – profundamente ideológico – de reestruturação das economias europeias. As reformas laborais que estão a ser preparadas por toda a Europa são, junto com a privatização dos serviços públicos, o estágio final desse projecto neoliberal. Ao atacarem o emprego, elas assaltam o alicerce central do sistema social e a própria ideia de Estado europeu. O pacto social europeu, conquista maior dos trabalhadores no pós-guerra, representa hoje uma pedra no sapato do capital financeiro, um obstáculo ao lucro desenfreado. E será quebrado contra a parte mais fraca se os trabalhadores europeus não se unirem para defender os seus direitos. Mais do que a própria crise, as politicas que a “combatem” estão determinadas a provocar alterações profundas na Europa que conhecemos. Muito para além dos efeitos imediatos do próprio crash, as economias europeias têm agora de suportar o oportunismo de quem viu na crise o momento para impor aquilo que nunca antes tinha conseguido fazer aprovar: a liberalização total do espaço europeu. Em Portugal este projecto liberal tem raízes nos anos oitenta. Até hoje, não existiu um único governante que se recusasse a dar-lhe continuidade. Sócrates e Passos Coelho, com óbvias distinções, não fizeram nem farão diferente, sempre no caminho que Cavaco Silva delineou. Cabe aos trabalhadores despedir esta elite dos interesses, não por qualquer razão atendível, mas por justa causa. A Comuna |
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