sábado, agosto 28, 2010

“Lupen-burguesia”, parasitas e decomposição PDF Imprimir e-mail
Onde se situa hoje uma grande parte da burguesia? Na dependência do Estado.
 Artigo de Moisés Ferreira
A burguesia, que com a sua revolução, trouxe uma nova ordem económica mundial, uma nova relação de produção; que imprimiu alterações fundamentais na infra-estrutura e na super-estrutura; que enterrou um sistema feudal e aristocrata de esclavagismo das classes inferiores e de puro rentismo por parte das classes superiores; que revolucionou na ciência, na tecnologia, nos transportes, na maquinaria, etc., estará agora a sentir o fim do seu tempo? O projecto liberal-burguês mostra sinais de decomposição e de retorno a um modelo rentista e dependente e onde predomina a acumulação e parasitária de capital em detrimento da aplicação do capital em capital produtivo.
 
Ainda que se arvore dos ideais do liberalismo, da demissão do Estado em questões de mercado; ainda que permanentemente o projecto liberal-burguês e os partidos que o sustentam venham dizer que é preciso diminuir o peso do Estado na vida pública, o que é certo é que essa mesma burguesia se encontra e faz-se cada vez mais dependente dos Estados, o mesmo é dizer do dinheiro público, o mesmo é dizer do dinheiro dos trabalhadores em geral.
 
Este é um sinal de decomposição dessa ordem económica que a burguesia fundou: ao discurso do livre mercado contrapõe-se a necessidade de Parcerias Público Privadas para alimentar uma clientela burguesa; ao discurso da demissão do Estado da economia contrapõe-se o apelo da burguesia aos Estados para que estes salvassem o sistema bancário e a sua forma de vivência rentista baseada no casino das bolsas e do capital fictício; ao discurso da necessidade de menos Estado vemos uma burguesia a tentar acumular mais capital à custa dos Estados e das privatizações de sectores estratégicos, monopólios naturais e sectores que são garantidamente rentáveis.
 
Onde se situa hoje uma grande parte da burguesia? Na dependência do Estado. Vive à custa de injecções de dinheiro no sistema bancário, vive à custa da especulação sobre os défices; vive à custa dos negócios que os Estados e partidos da burguesia arranjam para si, como as parcerias público privadas e as privatizações “cirúrgicas” dos sectores que davam lucro ao Estado e agora passam a dar lucro à burguesia.
 
A burguesia, que desempenhou em tempos um papel revolucionário, mostra hoje que é necessário um novo salto qualitativo na história em direcção a uma nova sociedade. A mandriice, o rentismo, a improdutividade e a inacção feudal contra a qual a burguesia se rebelou é hoje a mandriice, o rentismo, a improdutividade e inacção que caracteriza grande parte dessa mesma burguesia. Todas elas resultantes de uma dependência absurda e parasitária em relação aos Estados e, determinante no novo imperialismo, o predomínio da financeirização do regime capitalista.
 
Podem dizer-nos que quem vive desta forma, quem acumula capital em dependência para com os Estados, quem vive do rentismo e do capital fictício são apenas pequenas camadas putrefactas ou decompostas da burguesia: os “lumpen-burgueses” que, à semelhança do lumpen-proletariado, faria parte de restos de uma velha sociedade encaixada na nova ordem de classes.
 
Mas esta “lumpen-burguesia” dependente e parasitária não é apenas uma minoria no projecto liberal-burguês e não se trata de representantes de uma velha sociedade; é sim, uma classe a regressar a modelos de acumulação e rentismo que existiram numa velha sociedade e que agora se recuperam como necessidade de uma burguesia que não consegue sobreviver sem os Estados e sem os seus partidos de Governo.
 
Podemos isolar uma “lumpen-burguesia” ou uma parte dessa ”lumpen-burguesia” da burguesia em geral, apesar de se saber que são co-proprietários de imensas empresas e multinacionais, nomeadamente pela via da detenção de acções, considerar que ela conforma uma “classe própria” dentro da classe burguesa global, apesar de ser numericamente menor, e dizer que é ela quem dita as regras aos governos predominantes no imperialismo global e é ela quem fez abortar ou tornar simbólicas as tímidas tentativas de regulação financeira global?
 
Se assim for poderemos colocar uma questão: perante um cenário em que esta parte ou esta “lumpen-burguesia” improdutiva e dependente se alastra: onde fica o problema da dialéctica? Se em termos de aplicação do capital em capital produtivo, burguesia e proletariado se encontravam numa relação dialéctica, em que um necessitava do outro (ainda que a relação de forças estivesse do lado da burguesia por deter o capital e meios de produção); que faz esta “lumpen-burguesia” para que seja necessária ao proletariado se nada produz e vive da dependência do Estado e do rentismo?
 
Neste caso a “lumpen-burguesia” necessita do proletariado porque necessita dos seus impostos para se manter como classe dominante e detentora do capital e do Estado como “plataforma funil” que encaminha os fundos à sua boca ávida e submete o proletariado. Mas qual é a relação dialéctica que o proletariado estabelece com esta classe, se ela se mostra inútil, se não cria postos de trabalho por ela, se depende do Estado e nesta dependência destrói o Estado social?
 
Poderemos afirmar que a “lumpen-burguesia” reconhece o extremo acirrar dessa contradição ao impor a aceleração do neoliberalismo, em particular na Europa?
 
Com este artigo não se pretende o encontrar de uma nova categoria social ou ideológica e sua definição, tão-só o espicaçar da interrogação dialéctica tão necessária aos novos tempos. Afinal, estes novos tempos vão tornando cada vez mais visível a necessidade de uma ruptura revolucionária.
A Comuna

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