sexta-feira, fevereiro 12, 2010

O INÍCIO DO ISOLAMENTO DE SÓCRATES

Política
Jaime Gama preocupado com a credibilidade do primeiro-ministro

Depois da dramatização e da ameaça de uma crise política, o PS teme agora um problema chamado José Sócrates. O incómodo provocado pela divulgação das escutas do processo Face Oculta (as já noticiadas pelo Sol e as que o semanário promete revelar na sexta-feira), e que atingem a credibilidade do primeiro-ministro, já se faz sentir ao mais alto nível do Estado. Ao que o PÚBLICO apurou, o presidente da Assembleia da República (AR), Jaime Gama, já manifestou a sua profunda preocupação com os efeitos que as notícias podem vir a ter no Governo, no PS e na liderança do partido.

Na reunião do Conselho de Estado, na passada semana, Gama concordou com o Presidente da República sobre a necessidade de todos os partidos convergirem para a criação de uma sólida estabilidade política. Um dia depois, no Parlamento, reiterou o apelo, apontando que as instituições devem concentrar-se na "resolução dos problemas" do país. Agora, após a publicação de excertos do despacho do juiz de Aveiro, Gama ganhou novas preocupações. Que se estendem à bancada parlamentar e ao partido: em surdina, vários dirigentes do PS começam a olhar Sócrates como um problema que está a ganhar proporções cada vez maiores, sobretudo porque aguardam a divulgação de mais escutas comprometedoras para o primeiro-ministro.

Os receios dos socialistas alargam-se também à possibilidade de a oposição avançar para uma comissão de inquérito. Ontem, o deputado social-democrata Pedro Duarte, durante a reunião da Comissão de Ética, informou que o PSD apoiará o inquérito de acordo com as "conclusões das audições".

A oposição em bloco votou a favor das audições a personalidades, jornalistas e entidades propostas pelo PSD. O PS ainda pediu (depois de um compasso de espera para decidirem sobre o seu sentido de voto) para o PSD alterar o texto do requerimento, mas, perante a recusa dos sociais-democratas, optou pelo voto contra.

Os sociais-democratas propuseram ouvir 25 pessoas (às quais juntaram o ministro dos Assuntos Parlamentares, Jorge Lacão, sugerido pelo CDS). A primeira série de audições englobará personalidades e jornalistas: Mário Crespo, José Manuel Fernandes, Manuela Moura Guedes, Felícia Cabrita, Armando Vara, Paulo Penedos e Rui Pedro Soares, entre outros.

Sócrates critica PS

A ausência de vozes solidárias com Sócrates, entre os socialistas, foi ontem criticada pelo próprio primeiro-ministro. Que, em Cantanhede, afirmou que todos os partidos, "sem excepção", "aproveitaram o cometimento de um crime para com esse crime atacarem os adversários políticos e atacarem-me a mim, em particular" (ver texto ao lado). No entanto, horas antes, o líder parlamentar, Francisco Assis, condenara a divulgação das escutas, considerando-a como um crime de "violação do segredo de justiça e divulgação indevida de escutas".

As declarações de Sócrates não satisfizeram a oposição. PSD, CDS, BE e PCP exigem esclarecimentos sobre a compra de uma participação da TVI pela PT. E colocam a questão no campo político e não no judicial.

"Houve ou não promiscuidade entre empresas de capital público e grupos de comunicação social para compra de uma estação de televisão e mudança da respectiva linha editorial?", questionou o líder parlamentar do BE, José Manuel Pureza. O líder da bancada do PSD, Aguiar Branco, acusou o primeiro-ministro de ensaiar "mais uma vez uma imagem de vitimização" ao "atacar o PSD para desviar a atenção do essencial" - "o condicionamento do exercício da liberdade de expressão".

Bernardino Soares, líder da bancada comunista, partilhou da preocupação de Sócrates sobre a divulgação de matéria em segredo de justiça, mas sublinhou que "continua a não dar explicações sobre o seu conteúdo".

O líder parlamentar do CDS apontou contradições a Sócrates. "Quando questionado na AR, disse que não tinha conhecimento [do negócio], num segundo momento, depois das eleições, disse que não tinha conhecimento oficial", notou Mota Soares.

O alegado plano para controlar os media originou uma acesa troca de palavras entre o eurodeputado do PSD Paulo Rangel e Francisco Assis. Um dia depois de Rangel ter levantado o assunto em Estrasburgo, Assis acusou-o de usar um crime para fazer afirmações "indignas" sobre a liberdade de imprensa. "Só faltava agora que houvesse uma mordaça para os deputados", respondeu Rangel.

In Público.

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