sexta-feira, março 19, 2010

PEC 2010-2013:
O governo sacrifica o crescimento económico, o emprego e o nível de vida para reduzir o défice e agradar "os analistas e os mercados"

por Eugénio Rosa [*]

RESUMO DESTE ESTUDO

O PEC que o governo apresentou revela que objectivos importantes como o crescimento económico elevado; a redução do desemprego; a garantia de melhores condições de vida para os trabalhadores e reformados, apesar de constituírem as grandes preocupações dos portugueses, estão totalmente ausentes do programa e das preocupações do governo. A única preocupação do governo é reduzir o défice. Mesmo a nível de destinatários, os únicos referidos são os "agentes económicos, analistas e instituições internacionais" para os quais "é muito importante que o PEC seja credível ". Portanto, os portugueses foram também esquecidos no PEC pelo governo.

O governo pretende reduzir em quatro anos (2010-2013) o défice orçamental em 6,5 pontos percentuais (de 9,3% do PIB para 2,8%). Tomando como base o PIB de 2010 isto significa uma redução de 10.880 milhões de euros. É evidente que isso é só possível com uma redução muito significativa nas despesas de investimentos, das despesas de pessoal e das despesas sociais. Até porque o governo se recusa a desenvolver um combate à evasão e fraude fiscal que determinou o descalabro das receitas fiscais. E as consequências económicas e sociais de uma redução de 10.880 milhões €, ainda por cima em plena crise, não poderão deixar de ser desastrosas.

Entre 2000 e 2009, a média de crescimento da economia portuguesa foi apenas 0,9%, (56% da média da UE). Apesar deste crescimento anémico, o governo prevê que, entre 2010 e 2013, a taxa de crescimento anual seja apenas de 1,2%, ou seja, cerca de 50% da média da taxa de crescimento dos países da UE. Com aquela taxa de crescimento, Portugal nunca sairá da crise.

Para reduzir o défice o governo tenciona reduzir o investimento público, numa altura em que ele é essencial. Entre 2004 e 2010, o investimento de todas as Administrações Públicas diminuirá em -27,8% e a nível do PIDDAC em -51,7%. Se analisarmos apenas a variação entre 2009 e 2010 conclui-se que a redução no investimento atinge -8,8% nas Administrações Públicas e -24,5% no PIDDAC. E isto apesar das previsões do crescimento da FBCF (investimento total do País), que constam do PEC serem as seguintes: 2010. -0,8%; 2011: +1%; 2012: +1,6%; 2013: +1,8%. Com este nível de investimento não se consegue modernizar a economia nem aumentar o emprego e as exportações.

Para reduzir o défice o governo tenciona também reduzir ainda mais as despesas com os trabalhadores da Função Pública. Entre 2005 e 2010, elas passam de 14,3% do PIB para apenas 10,9%, o que significa uma redução acumulada que atinge 16.663 milhões €. Mas o governo ainda não está satisfeito e pretende que as de 2013 sejam inferiores às de 2009 em 1,3 pontos percentuais, o que significa uma redução de 2.175 milhões € tomando como base o valor do PIB de 2010. E isso só possível através do reforço da regra "uma entrada pelos menos duas saídas" na Administração Pública, que levará ao aumento de ritmo de destruição de emprego público; de "uma politica de forte contenção salarial" que levará à diminuição do poder de compra dos trabalhadores (se as remunerações forem congeladas, à semelhança do verificado em 2010, a redução do poder de compra será superior a 7% até 2013); de alterações no Estatuto da Aposentação (entre 2010 e 2013, a redução nas despesas com pensões atingirá 300 milhões €).

Para reduzir o défice o governo tenciona reduzir as despesas com as prestações sociais. E isto apesar de, em 2007, as despesas com a protecção social representarem, em Portugal, apenas 24,8% do PIB, quando na União Europeia correspondia em média a 26,2%, e na zona Euro a 27%. Em 2009, de acordo com o PEC, elas representarem em Portugal somente 21,9% do PIB. Apesar disso, o governo pretende reduzi-las para 21,4% do PIB (-0,5 pontos percentuais), o que corresponde a uma redução de 836,8 milhões de euros no apoio às classes desfavorecidas.

Para reduzir o défice, o governo pretende aumentar a carga fiscal. Exs: (1) Redução na dedução das despesas com a saúde e com a educação, o que determinará que os contribuintes com matéria colectável superior a 7.200 euros por ano, tenham um aumento de imposto que varia entre 100€ (para o escalão mais baixo entre 7250€ e 17.979€) e 700€ (para o escalão mais elevado superior a 64.623€);(2) Redução da dedução especifica de IRS para as pensões de valor superior a 22.500 €/ano de 6.000 euros para 4.000 €, o que determinará que 2.000 € que antes não eram sujeitos a IRS passem a ser;(3) Actualização apenas de 0,8% dos escalões do IRS em 2010, o que determinará que muitos trabalhadores paguem mais IRS por mudarem de escalão.

Para reduzir o défice, o governo tenciona introduzir portagens nas SCUTS (mais aumentos de preços); rever planos de pensões e de saúde nas empresas públicas (redução de direitos e aumento de encargos para os trabalhadores); reduzir o "montante das indemnizações compensatórias devidas" (subida dos preços dos transportes públicos). E privatizar as empresas públicas e participações que restam e que dão lucro ao Estado, o que agravará o défice.

É inadmissível que a redução do défice se faça à custa do crescimento económico, do emprego e das condições de vida da população como resulta deste PEC. O caminho tem de ser como mostramos na parte final deste estudo. A redução do défice tem de ser feita com crescimento.

O "Programa de Estabilidade e Crescimento 2010-2013" (PEC:2010-2013) já divulgado pelo governo contém os pontos essenciais do PEC que o governo tenciona enviar à Comissão Europeia. De acordo com ele o PEC deve apenas (pág.1) : (1) Definir um estratégia de redução do défice e correcção do crescimento da divida até 2013; (2) Privilegiar a redução da despesas; (3) Manter um quadro de estabilidade fiscal; (4) Assegurar a sustentabilidade das finanças públicas; (5) Reforçar o quadro orçamental; (6) Articular-se com uma politica de reformas estruturais para a modernização e competitividade da economia portuguesa e para o combate ao endividamento externo. Portanto, objectivos como o crescimento económico e a redução do desemprego, que são os problemas mais graves que enfrenta o País e os portugueses estão totalmente ausentes.

UM CRESCIMENTO ECONÓMICO QUE AGRAVARÁ O ATRASO DO PAÍS E AUMENTARÁ O DESEMPREGO

De acordo com as previsões do governo constantes do PEC-2010-2013, o crescimento económico, medido pelo PIB, será nos próximos 4 anos o seguinte: 2010:+0,7%; 2011: +0,9%; 2012: +1,3%; 2013: +1,7%. A média destes valores corresponde apenas 1,15%, o que significa uma taxa de crescimento de cerca de 1,2% por ano no período 2000-2013. Com taxas de crescimento desta dimensão o País não conseguirá sair da situação de crise e de atraso em que se encontra mergulhado, e o desemprego continuará a aumentar, até porque a experiência já provou que, enquanto o crescimento económico não atingir pelo menos 2%, não se verificará uma redução sustentada da taxa de desemprego.

Se compararmos a média das taxas previstas de crescimento da economia portuguesa no período 2000-2013, com as dos países da U.E cujos governos já apresentaram previsões para o mesmo período concluímos que a de Portugal é a mais baixa e, consequentemente, o atraso do País relativamente à média comunitária continuará a acentuar-se. O quadro seguinte mostra isso.

QUADRO I – Média das taxas de crescimento económico
previstas nos países da UE no período 2010-2013,
segundo os respectivos governos

PAÍSES
Media das taxas de crescimento económico 2010-2013
Alemanha 1,85%
Áustria 1,73%
Dinamarca 1,80%
Eslovénia 2,65%
Espanha 1,88%
Estónia 2,73%
Finlândia 2,40%
França 2,23%
Grécia 1,40%
Irlanda 2,70%
Itália 1,55%
Luxemburgo 2,78%
MEDIA DOS 12 PAÍSES 2,14%
PORTUGAL 1,15%

No período 2010-2013, a média das taxas de crescimento da economia portuguesa (1,15%) corresponde apenas a 54% da média das taxas de aumento do PIB dos 12 países da União Europeia cujos governos apresentaram previsões para 4 anos. E em relação aos outros 12 países em que existem previsões de apenas três anos (2010-2012), a diferença é ainda maior, já que em relação a esse período (2010-2012) a média das taxas desses países é de 2,42% enquanto a de Portugal, para o mesmo período, é apenas 0,97%, ou seja, somente 40%. Estes números oficiais provam que o governo actual é incapaz, com a politica que teima em prosseguir, de fazer sair o País da crise e do atraso em que se encontra mergulhado há mais de uma década.

UM VOLUME DE INVESTIMENTO QUE IMPEDE A MODERNIZAÇÃO DA ECONOMIA E DETERMINA A REDUÇÃO DA COMPETITIVIDADE

Outro aspecto grave das previsões do governo para os próximos anos, constantes do PEC.2010-2013, é a variação do investimento. Apesar da estagnação do investimento verificado em 2008 (+0,5%) e da redução significativa registada em 2009 (-12,6%), as previsões do governos para os próximos 4 anos são, no mínimo, preocupantes para o futuro do País e dos portugueses : 2010. -0,8%; 2011: +1%; 2012: +1,6%; 2013: +1,8%. Em 4 anos, nem se consegue recuperar a quebra verificada em 2009 sendo o investimento total no País, em 2013, , a preços constantes, inferior ao de 2008 em -9,4%.

O Orçamento do Estado aprovado para 2010, concretiza já, para este ano, o Programa de Estabilidade e Crescimento. Numa altura que, face à quebra verificada no investimento privado, o Estado devia compensar essa quebra e animar o investimento das empresas, verifica-se precisamente o contrário. De acordo com dados constantes do relatório que acompanhou o OE2010, verificar-se-á este ano uma quebra significativa no investimento público como o mostra o quadro seguinte.

QUADRO II – Variação do Investimento Público (Administrações Públicas e PIDDAC) no período 2004 a 2010 a preços correntes

ANOS
INVESTIMENTO TOTAL DAS ADMINISTRAÇÕES PÚBLICAS
(Óptica da Contabilidade Nacional)
Milhões de euros
PIDDAC
Milhões de euros
FBCF (Investimento)
Outras Despesas
Despesas Capital
2004 5.683 2.076 7.759 5.861
2005 4.183 1.896 6.079 4.069
2006 3.747 1.740 5.487 4.854
2007 3.634 1.812 5.446 4.978
2008 1.880 2.617 4.497 3.616
2009 4.501 2.404 6.905 3.751
2010 4.104 1.502 5.606 2.833
2010-04 -27,8% -27,6% -27,8% -51,7%
2010-09 -8,8% -37,5% -18,8% -24,5%
Fonte: Relatórios do OE2004 a OE2010

Entre 2004 e 2010, o investimento de todas as Administrações Públicas diminuirá em -27,8% e o do PIDDAC reduzir-se-á em -51,7%. E isto em valores nominais. Se entramos com o efeito do aumento de preços a quebra é muito maior, atingindo -35,9% a nível das Administrações Públicas e -57,1% no PIDDAC. Se a análise for feita apenas ao período de um ano (2009/2010), a redução no investimento atinge -8,8% a nível das Administrações Públicas e -24,5% no PIDDAC. E o governo tenciona fixar também um tecto a estas despesas, pois como consta do PEC "o peso das despesas de capital estabilizará em 2013 em 2,9% do PIB" (pág. 6).

A obsessão de reduzir o défice orçamental e a submissão a Bruxelas e aos chamados "mercados" é tão grande que leva este governo a cortar no investimento em pleno período de crise. E isto apesar de os últimos dados do PIB divulgados pelo INE revelarem que Portugal corre o risco de cair novamente em recessão económica (no 4º Trim.2009, o PIB caiu -1%, e o PIB de 2009 foi inferior ao de 2008 em -2,7%)

A REDUÇÃO DE 2.175 MILHÕES € NAS DESPESAS DE PESSOAL NAS ADMINISTRAÇÕES PÚBLICAS A JUNTAR À REDUÇÃO DE 16.663 MILHÕES € VERIFICADA NO PERIODO 2004-2010

No período 2004-2010, as despesas com pessoal, ou seja, com os trabalhadores da Administração Pública passaram de 14,5% do PIB para 10,4%, como mostra o quadro seguinte.

QUADRO III – Redução das remunerações e das despesas de pessoal das Administrações Públicas no período 2005-2010
ANOS
(1)
Remunerações certas e permanentes da Administração Central
Milhões €
(2)
Despesas de Pessoal das Administrações Publicas
Milhões €
(3)
PIB
Milhões euros
(4)
% do PIB
Valor das Remunerações da Adm. Publica Central se fosse igual % do PIB de 2005
Milhões €
(7)
Valor das Despesas de Pessoal das Adm. Públicas se fosse igual % do PIB de 2005
Milhões €
(8)
Remunerações da Administração Pública Central
(5)
Despesas Pessoal Administrações Públicas
(6)
2005 8.558 21.328 149.123 5,7% 14,3% 8.558 21.328
2006 8.719 21.174 155.446 5,6% 13,6% 8.920 22.232
2007 8.310 21.059 163.238 5,1% 12,9% 9.368 23.346
2008 8.332 21.008 166.128 5,0% 12,6% 9.533 23.760
2009 8.355 18.662 164.880 5,1% 11,3% 9.462 23.581
2010 8.224 18.290 167.367 4,9% 10,9% 9.605 23.937
SOMA 50.497 121.521


55.445 138.183
Redução das remunerações certas e permanentes na Adm. Central (2-7) -4.948
Redução acumulada das despesas de Pessoal nas Administrações Públicas (3-8) -16.663
Fonte: Relatórios do OE : 2005 a 2010

De acordo com os dados do governo, se no período 2005 -2010, os gastos medidos em percentagem do PIB, tivessem sido iguais aos de 2005 (Remunerações certas e permanentes da Administração Central: 5,7% do PIB; Despesas de Pessoal em todas as Administrações Públicas: 14,3% do PIB) as despesas com remunerações certas e permanentes da Administração Central teriam sido superiores em 4.948 milhões de euros, e as despesas de pessoal de todas as Administrações Públicas (Central, Local e Regional) teriam sido superiores em 16.663 milhões de euros às verificadas. Portanto, uma parte importante da redução do défice orçamental tem sido conseguida à custa dos trabalhadores e dos aposentados das Administrações.

No entanto, o governo ainda não está satisfeito e pretende impor mais sacrifícios a estes trabalhadores. De acordo com o PEC:2010-2013, entre 2009 e 2013, o governo pretende reduzir as despesas de Pessoal nas Administrações Públicas de 11,3% para apenas 10%. A redução de 1,3 pontos percentuais, representa, com base nos valores actuais do PIB, uma redução de 2.175 milhões de euros nas despesas de pessoal só no ano de 2013. Em relação às de 2005, corresponde a uma redução de 4,3 pontos percentuais, ou seja, a 7.126 milhões de euros. E tudo apenas no ano de 2013, porque nos anos anteriores também se verificaram "poupanças" importantes à custa dos trabalhadores da Função Pública. Por outro lado, e segundo o Relatório do OE2010, " o impacto financeiro da introdução conjunta das duas alterações ao Estatuto da Aposentação constantes da lei do Orçamento de 2010 aprovada é estimado numa redução na despesa em pensões de 300 milhões de euros, em termos acumulados, até 2013"( pág. 33 , do Relatório do OE2010). Estes números, embora meramente indicativos, dão já uma ideia clara da dimensão dos sacrifícios que estão a ser impostos aos trabalhadores da Função Pública, e da degradação dos serviços públicos associados, com efeitos bastante negativos para a população. E isto tudo isto com a justificação do défice, dos "mercados", e da Comissão Europeia, o novo FMI.

PORTUGAL É DOS PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA COM DESPESAS DE PROTECÇÃO SOCIAL MAIS BAIXAS MAS O GOVERNO PRETENDE AINDA REDUZI-LAS EM 836,8 MILHÕES €

O quadro seguinte, construído com os últimos dados do Eurostat, em Portugal as despesas totais com a protecção social, em % do PIB, já estavam em 2007 muito abaixo da média comunitária.

QUADRO IV – Despesas totais de protecção social – em % do PIB
PAÍS/ANO
2004
2005
2006
2007
União Europeia (27 países) : 27,1 26,7 26,2
União Europeia (15 países) 27,6 27,7 27,3 26,9
Zona Euro (16 países) 27,7 27,7 27,4 27
Zona Euro (15 países) 27,7 27,8 27,4 27
PORTUGAL 24,7 25,3 25,4 24,8
Fonte: Eurostat

Em 2007, as despesas totais com a protecção social representavam, em Portugal, apenas 24,8% do PIB, quando na União Europeia (27 países) correspondia em média a 26,2%, e na zona Euro a 27%. Em 2009, de acordo com dados constante do PEC, elas representavam em Portugal somente 21,9% do PIB. Apesar disso, o governo pretende reduzi-las para 21,4% do PIB (-0,5 pontos percentuais), o que corresponde a uma redução de 836,8 milhões de euros, tomando como base o valor do PIB previsto para 2010, no apoio às classes da população mais desfavorecidas.

Para isso, o governo tenciona definir "um tecto de despesa para as prestações sem base contributiva", os seja, as prestações recebidas pelos portugueses que não têm recursos para viver. (abaixo do limar da pobreza) E isso será feito por meio da "definição de um tecto para a transferência do Orçamento do Estado para a Segurança Social tendo em vista o financiamento de prestações dessa natureza " (pág. 5 do PEC). Com esse objectivo, , pretende impor a "manutenção do valor nominal de todas as prestações não contributivas até 2013" (pág. 5 do PEC), o que determinará, tendo em conta a taxa de inflação prevista pelo próprio governo, uma redução de cerca de 7% no poder de compra dos valores das pensões sociais, do complemento social de idoso, do rendimento de inserção social, etc., ou seja, de todos aqueles que têm um rendimento abaixo do limiar da pobreza, cujo numero atingia, no fim de 2009, 570.000 portugueses. Para além disso, o governo pretende "eliminar as medidas temporárias anti-crise de apoio social", ou seja, o alargamento do subsidio social de desemprego por mais 6 meses aos trabalhadores desempregados que já não recebiam qualquer subsidio, e alterar "o regime do subsidio de desemprego visando promover um mais rápido regresso à vida activa" (pág. 5 do PEC), o que só poderá ser interpretado como a intenção de reduzir ou o valor do subsidio de desemprego ou o período de tempo que o desempregado tem direito a recebê-lo.

O AUMENTO DA CARGA FISCAL QUE INCIDE SOBRE OS TRABALHADORES E OS REFORMADOS

Outra medida que o governo tenciona tomar para aumentar as receitas, e assim reduzir o défice orçamental, é aumentar a carga fiscal que incide sobre os trabalhadores e pensionistas. Para além da actualização dos escalões do IRS em apenas 0,8% em 2010, o que vai determinar que os trabalhadores que tenham subidas de remunerações superiores àquela percentagem possam mudar de escalão e serem obrigados a pagar mais imposto relativamente a uma parcela do seu rendimento, existem no PEC uma série de medidas que determinarão certamente um aumento da carga fiscal para os portugueses, nomeadamente para trabalhadores e pensionistas. Entre essas medidas destacam-se as seguintes: (1) Redução na dedução das despesas com a saúde e com a educação, o que determinará, segundo o próprio PEC, que os contribuintes com matéria colectável superior a 7.200 euros por ano, tenham um aumento de imposto que varia entre 100€ (para o escalão mais baixo entre 7250€ e 17.979€) e 700€ (para o escalão mais elevado superior a 64.623€); (2) A redução da dedução especifica de IRS para as pensões de valor superior a 22.500 €/ano de 6.000 euros para 4.000 euros, o que determinará que 2.000 € que antes não eram sujeitos a IRS passem a ser (estas pensões encontram-se congeladas há já vários anos).; (3) Imposição de uma taxa extraordinária de IRS de 45% aos rendimentos superiores a 150.000€, cujo é número reduzido, o que tem principalmente um objectivo simbólico. Uma medida positiva de natureza fiscal que consta do PEC é 2 a sujeição das mais-valias à taxa de IRS de 20%" (pág.6). Mas esta o governo não tenciona implementá-la imediatamente, como ficou claro durante o debate do OE2010, em que o PS defendeu o seu adiamento para um futuro indeterminado.

MAIS PORTAGENS, A REVISÃO DOS PLANOS DE PENSÕES E DE SAÚDE, A REDUÇÃO DAS INDEMNIZAÇÕES COMPENSATÓRIAS E A PRIVATIZAÇÃO DAS EMPRESAS PÚBLICAS

Para além das medidas anteriores, são ainda referidas no PEC do governo: (a) Introdução das portagens nas SCUTS, portanto mais aumentos de preços (pág. 7); (b) A revisão dos planos de pensões e de saúde nas empresas do Sector Empresarial do Estado (pág. 7), naturalmente com o objectivo de reduzir direitos e aumentar os encargos para os trabalhadores; (c) A redução do "montante das indemnizações compensatórias devidas" (pág. 7), que levará certamente à subida elevada dos preços dos transportes públicos. Em resumo, um conjunto de medidas que vão todas elas no mesmo sentido: agravar as condições de vida dos portugueses.

Dominado também pela obsessão de reduzir a divida pública e, consequentemente, também o défice o governo tenciona, como consta do PEC, realizar um "conjunto de privatizações que permitirá obter uma receita na ordem dos 6.000 milhões de euros" (pág. 7). Embora não indique expressamente quais as empresas a privatizar, é de prever que sejam todas aquelas que dão lucro, pois só estas é que os privados estarão interessados em adquirir. E vender naturalmente ao desbarato, tendo em conta, a situação actual da bolsa, as empresas ou participações que ainda detém em empresas estratégicas, transferindo para privados, muitos deles certamente estrangeiros, o controlo dessas empresas, perdendo assim uma fonte importante de lucros, e dando aos privados instrumentos para eles poderem impor à população preços exorbitantes, como já acontece com a EDP, Galp e outras empresas que foram privatizadas.

O CAMINHO PODE E TEM DE SER OUTRO

É evidente que o governo podia seguir outro caminho para relançar a economia e reduzir o défice orçamental, estimulando o crescimento económico e não estrangulá-lo como resulta deste PEC. E esse caminho devia ser o seguinte: (1) Aumentar significativamente o investimento publico com o objectivo de dinamizar a economia e o investimento privado, para isso aproveitando também os fundos comunitários do QREN (até ao fim de 2009, dos 8.000 milhões € que podiam ter sido utilizados apenas foram menos de 2.000 milhões €); (2) Desenvolver um combate eficaz à evasão e fraude fiscal, que determinou o descalabro das receitas fiscais mas que o governo nada se propõe fazer; (3) Reduzir os benefícios fiscais, nomeadamente a empresas, cuja receita fiscal perdida aumentará, entre 2009 e 2010, de 2.407 milhões € para 2536 milhões €; (4) Reduzir as despesas com aquisições de serviços a empresas privadas e com Parcerias Público Privadas (privatização de serviços públicos), cujos custos atingirão, só em 2010, mais de 2.000 milhões €, já que os serviços prestados por esses privados podiam ser realizados por trabalhadores da Função Pública; (5) Eliminar situações escandalosas de não pagamento de impostos, de que é exemplo a isenção total que continuam a gozar as mais valias especulativas obtidas em bolsa; (6) Lançar um imposto extraordinário sobre os lucros dos bancos e de outras grandes empresas cujas manipulações e negócios nos mercados financeiros contribuíram fortemente para a crise cujas consequências os portugueses e o país estão a pagar; (7) Uma melhor repartição da riqueza produzida através do aumento do poder de compra dos salários e de pensões melhorando assim as condições de vida da população de mais baixos recursos, o que dinamizaria a economia

14/Março/2010
[*] Economista , edr2@netcabo.pt

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

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