domingo, julho 03, 2011

Empréstimo do FMI e da UE a Portugal é ilegítimo e não deve ser pago Versão para impressão Enviar por E-mail
010711_Eric_ToussaintÓpera mundi - Responsável pela auditoria das contas do Equador em 2007, o economista Éric Toussaint considera que o empréstimo do FMI (Fundo Monetário Internacional) e da União Europeia a Portugal é ilegítimo – e, por isso, não deve ser pago. Para o belga, presidente do Comitê para a Anulação da Dívida dos Países do Terceiro Mundo e membro do Conselho do Fórum Social Mundial, o governo português contraiu a nova dívida – no valor de 78 bilhões de euros (R$ 177 bilhões) – sem "autonomia da vontade".

As declarações foram dadas nesta quarta-feira (29/06) em Lisboa, em um evento coordenado pelo sociólogo Boaventura de Sousa Santos, da Universidade de Coimbra. "Para mim, o dinheiro que a troika [nome dado ao grupo que representa o Banco Central Europeu, o BCE e a Comissão Europeia] vai entregar a Portugal é ilegítimo, porque os credores utilizam um momento em que o governo está sob presão forte dos mercados para colocar condições em que há violações de direitos da população de Portugal", afirmou Toussaint.
O evento ocorreu no mesmo dia em que foi entregue ao Parlamento o programa do novo governo, em que a redução do déficit – que terminou 2010 três vezes acima do que o permitido – é a preocupação central. Nele estão previstas as medidas de austeridade negociadas com FMI, CE e BCE para recebimento da ajuda de 78 bilhões, e outras, como a criação de um imposto extraordinário e um leque de privatizações mais alargado.
"Suspeito fortemente que não vão ser eficazes para resolver o problema da dívida", considerou Sousa Santos, comentando de maneira genérica as medidas que vêm sendo propostas. "As medidas que vão ser tomadas nos próximos meses vão condicionar as vidas dos portugueses por décadas", explicou, durante sua intervenção.
Portugal solicitou o empréstimo em maio, depois de uma escalada nos juros dos títulos da dívida pública, que hoje superam os 11% nos prazos a 10 anos. A disparada ocorreu quando o governo socialista lierador por José Sócrates não conseguiu apoio no Parlamento para aprovar o pacote de austeridade que havia prometido a Bruxelas.
Auditoria e restruturação
"Portugal não deve pagar toda a dívida, deve pagar aquilo que é legal, legítimo e sustentável", opinou Sousa Santos. Para tanto, a auditoria é uma ferramenta para definir aquilo que está nessas condições.
A estratégia foi utilizada no Equador com o apoio do governo. Em 2007, o presidente Rafael Correa nomeou um comitê que analisou as dívidas interna e externa do país. A partir do resultado, decidiu que entre 25% a 30% da dívida externa comercial com bancos privados seriam acatados. Segundo Toussaint, mais de 90% dos credores aceitaram a proposta.
A decisão de suspender os pagamentos de dívidas já foi tomada 168 vezes desde a Segunda Guerra Mundial, lembrou Toussaint. "Não é uma exceção". O caso da Argentina, que entre o final de 2001 e 2002 também determinou o calote, foi descrito como exemplo.
Questionado durante o debate, o presidente da CADTM se mostrou disponível a auxiliar Portugal – onde, porém, um trabalho semelhante não deve contar com o apoio do governo. A saída, então, passa por exercer pressão, por exemplo por meio de parlamentares simpáticos à proposta.
Para Sousa Santos, "a restruturação da dívida deve ser feita segundo as lógicas e os tempos dos devedores", completando que deve se evitar que isso ocorra quando a economia está entrando em colapso.
Euro-crise
Toussaint acredita que a Bélgica, seu país de origem, também corre o risco de passar a ser alvo de especulação financeira, assim como aconteceu com Grécia, Irlanda e Portugal. Também a dívida e o déficit belgas, respectivamente de 98,6% e 4,1% em 2010, estão acima dos limites máximos permitidos para os países da zona euro – 60% e 3%. "Não descarto que o meu país venha estar sob chantagem dos mercados financeiros nos meses e anos que vêm."
"Temos que construir uma frente anti-crise europeia", propôs Toussaint, defendendo uma "refundação da União Europeia". As propostas para "uma outra Europa" de Toussaint incluem, além da auditoria da dívida, parar os planos de austeridade, transferir os bancos para o setor público mas sob controle dos cidadãos (para evitar a socialização de prejuízos), socializar empresas privatizada e reduzir o tempo de trabalho para criar empregos.
Ele também defendeu a regulação forte para os Credit Default Swaps – mecanismos de investimento que permitem que investidores especulem sobre o risco de calote dos países e que estão entre os responsáveis pelo estouro da crise do sub-prime nos EUA em 2008.
O Diário

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