A luta contra as portagens no Algarve - balanço e perspetivas |
“A Comissão de Utentes da Via do Infante é o movimento social mais interessante da última década no Algarve. Persistência, coerência e convição na causa da suspensão das portagens no Algarve têm transformado a CUVI num exemplo de cidadania política e social”. Podem ler-se estas frases, saídas no conceituado e insuspeito blog “Movimento Apartidário da Cidade de Loulé”, no passado dia 30 de março. Neste dia, uma delegação da CUVI abordou o Ministro da Economia numa sua deslocação ao Algarve, onde, além de lhe entregar um dossier sobre o assunto “portagens no Algarve”, confrontou-o, cara a cara, com um pedido de reunião desde agosto do ano passado. Pode não dar em nada, todavia Álvaro Santos Pereira recebeu o dossier, disse que o governo ia reavaliar a situação em junho e prometeu agendar a reunião para breve. Esta foi mais uma pequena iniciativa, entre tantas outras, pequenas e grandes, levadas a efeito no espaço de ano e meio pela Comissão de Utentes, numa luta tenaz e persistente contra a introdução de portagens na Via do Infante. Desde outubro de 2010 que as ações não têm parado – 9 marchas lentas na EN 125 e na A22 (8 marchas de viaturas e uma marcha a pé), uma Petição com 14 mil assinaturas dirigida à Assembleia da República, reuniões com todos os Grupos Parlamentares e com a Comissão de Obras Públicas, reuniões com o Governo Civil de Faro, com várias Câmaras Municipais da região, com a Entidade Regional de Turismo, com o Moto Clube de Faro, com a AMAL e outras entidades regionais, com o Ayuntamiento de Ayamonte e associações empresariais e sindicais da Andaluzia, a realização de um Fórum em Loulé e que juntou cerca de 2 centenas de pessoas, entre autarcas, empresários, deputados e utentes, diversas assembleias de utentes e ações simbólicas, muitas conferências de imprensa e, está a decorrer neste momento uma nova Petição que já terá muitos milhares de assinaturas exigindo a suspensão das portagens na Via do Infante. Algumas das marchas lentas envolveram a participação de centenas e até de milhares de viaturas. Por iniciativa da Comissão de Utentes, foram constituídas duas plataformas anti-portagens na região, envolvendo a AMAL e as principais organizações empresariais, sindicais e sociais da região e produzido um Manifesto conjunto. De facto, trata-se do “movimento social mais interessante da última década no Algarve”, para não ir mais longe. Tem sido uma caminhada nada fácil e a Comissão de Utentes tem sido atacada por todos os lados, principalmente por responsáveis políticos ligados à região e ao anterior e ao atual governo. Procuraram isolar a Comissão de Utentes, tentaram conotá-la partidariamente e, imagine-se, até acusaram os seus elementos de serem os responsáveis materiais e/ou morais dos ataques às estruturas de cobrança de portagens na Via do Infante. Alguns, que colaboraram no movimento anti-portagens ficaram pelo caminho alegando os pretextos mais esfarrapados, como por exemplo, o apelo à desobediência civil lançado pela CUVI. Outros, como a AMAL, capitularam subservientemente perante o governo troikano do PSD/CDS. Outros ainda, desistiram pura e simplesmente da luta. A Comissão de Utentes, sempre aberta a novas adesões e constituída por homens e mulheres de diferentes conotações político-partidárias e muitos independentes, tem respondido sempre da mesma forma – o trabalho e a luta intransigente, corajosa e determinada contra as portagens na Via do Infante. Até à sua supressão, total e definitiva, custe o que custar. Tal como a Comissão de Utentes sempre afirmou, a introdução de portagens na Via do Infante está a revelar-se uma autêntica calamidade para o Algarve, uma região onde o desemprego atinge a percentagem mais elevada – mais de 20% com 50 mil desempregados! A situação está a agravar-se todos os dias, com restaurantes e hotéis a encerrar, o setor das obras públicas à beira da falência (lançando no desemprego mais 2 mil pessoas), o comércio a declinar, os espanhóis a boicotarem o Algarve. Por outro lado, o Algarve regrediu 20 anos na circulação rodoviária com a transformação da EN 125 em extensas e morosas filas de veículos, onde ocorrem inúmeros acidentes com mortos e muitos feridos graves. De acordo com dados da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, no primeiro mês de cobrança das portagens, em dezembro, houve naquela via um aumento da sinistralidade em 30%; desde 1 de janeiro e até 7 de março houve 32 feridos graves, mais 11 em relação ao mesmo período de 2011 e mais 17 do que em 2010; os acidentes duplicaram nos primeiros meses de 2012 – 155 em comparação com os 81 acidentes registados em 2011. Esta é a negra realidade que se abateu sobre o Algarve! Mas há responsáveis por esta catástrofe social e económica – o anterior governo social-liberal de Sócrates, o atual governo troikano ultra-liberal de Passos/Portas, Mendes Bota e o PSD, Artur Rego e o CDS e Miguel Freitas e o PS, entre outros. Agora que pararam as obras de requalificação da EN 125, estes senhores nada dizem? Afirmavam que portagens só com a requalificação! Bom, antes também juraram a pés juntos que portagens no Algarve nunca! Mas o mais curioso e positivo tem a ver com o boicote dos utentes à Via do Infante: segundo as Estradas de Portugal e o Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias, em dezembro a A22 registou uma quebra de tráfego de mais de 48% em comparação com dezembro de 2010, com perto de 6500 veículos diários contra quase 12500; esta quebra aprofundou-se no início de 2012, atingindo os 58% face a janeiro e fevereiro de 2011! Revelou-se acertada a posição da CUVI, quando em dezembro passado lançou um apelo aos utentes a favor da desobediência civil ou, em alternativa, o boicote à Via do Infante. Muitos cidadãos têm circulado sem pagar e a esmagadora maioria optou pelo boicote. O Algarve, em comparação com as restantes ex-SCUT’s (a A22 não é SCUT) continua bem à frente nesta frente de luta. Neste momento, a luta pela suspensão das portagens no Algarve já atingiu uma dimensão verdadeiramente internacional. Na marcha de abril do ano passado, o Alcaide de Ayamonte e outros espanhóis já tinham participado na marcha sobre a ponte do Guadiana. Agora, essa dimensão internacional está institucionalizada e aumentou de intensidade por acção da CUVI. No passado dia 3 de fevereiro, em Ayamonte, teve lugar o I Encontro Transfronteiriço Hispano-Luso com a participação da Comissão de Utentes e de diversas entidades e associações sociais, empresariais e sindicais de Andaluzia, onde se destacou o Ayuntamiento de Ayamonte, a Federação Nacional das Associações de Transportadores de Espanha, as Comissiones Obreras e a UGT de Huelva. Neste encontro foi constituída a Comissão luso-espanhola para a supressão das portagens na A22 e foi aprovado um pré-manifesto de apoio a uma área transfronteiriça (Algarve-Huelva) livre de portagens. O referido Manifesto foi assinado em Huelva, no dia 9 de março, na sede da Federação Onubense de Empresários (de Huelva), juntando a Comissão de Utentes da Via do Infante e cerca de três dezenas de associações empresariais, sindicais, de transportes e representantes políticos de Andaluzia, incluindo o Alcaide de Ayamonte. A assinatura do acordo na sede da FOE revelou-se de um significado especial, pois o edifício onde se encontra chama-se Centro Empresarial Andaluzia-Algarve e é um dos muitos projectos realizados ao longo dos anos graças à cooperação transfronteiriça. O próprio Alcaide sublinhou que a criação da Eurorregião Alentejo-Algarve-Andaluzia prevê a eliminação de qualquer obstáculo ao desenvolvimento socioeconómico de ambos os lados da fronteira e as portagens constituem um entrave. A luta contra as portagens no Algarve agora é uma luta ibérica. Saliente-se que a luta dos espanhóis contra as portagens envolve todas as antigas SCUT’s. Neste momento a Comissão de Utentes procede à divulgação do Manifesto entre as diversas entidades e associações do Algarve, procurando a sua adesão. E brevemente terão lugar reuniões de trabalho com os espanhóis da Andaluzia para preparar diversas iniciativas conjuntas pela supressão das portagens no Algarve, a mais forte será certamente uma marcha lenta envolvendo a Ponte Internacional do Guadiana que poderá ficar bloqueada. O tempo é de acção e não de resignação! Com coragem, determinação e confiança! João Vasconcelos Obs: artigo publicado em A Comuna, de 3 de abril de 2012. |
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