segunda-feira, dezembro 13, 2010

Presidente do BCP ofereceu-se aos EUA para espiar o Irão

Carlos Santos Ferreira ofereceu-se aos Estados Unidos da América para espiar as actividades financeiras do Irão e, em troca, fazer negócios com aquele país. A operação era do conhecimento do Governo, segundo revela o jornal El Pais, a partir de telegramas divulgados por wikileaks. Bloco de Esquerda questiona o Banco de Portugal.
Carlos Santos Ferreira, presidente do Millenium BCP, 28 de Julho de 2010 – Foto de João Relvas/Lusa
Carlos Santos Ferreira, presidente do Millenium BCP, 28 de Julho de 2010 – Foto de João Relvas/Lusa
O actual presidente do Millenium BCP, Carlos Santos Ferreira, propôs à embaixada dos EUA em Lisboa, “estabelecer uma relação com o Irão para ajudar o Governo dos EUA a rastrear fundos e actividades financeiras iranianas”, segundo divulgou neste domingo o site do jornal espanhol El Pais, a partir de telegramas tornados conhecidos pelo wikileaks.
Segundo o telegrama da embaixada dos EUA em Lisboa, em Abril de 2009 uma delegação do BCP composta por dois altos funcionários, José João Guilherme, membro do conselho de direcção, e Duarte Pita Ferraz, director da unidade de assuntos internacionais, visitou o Irão a convite da embaixada daquele país em Lisboa. A delegação teve reuniões com o Banco Central do Irão, sete bancos, a organização de investimento e assistência técnica do Irão e a embaixada portuguesa, e discutiram a possibilidade de fazer negócios sem violar as restrições da UE e as sanções da ONU ao Irão.
Dez meses depois, em Fevereiro deste ano, Santos Ferreira apresentou à conselheira política e económica da embaixada dos Estados Unidos em Lisboa, que na altura estava sem embaixador, a proposta do BCP estabelecer negócios com o Irão e em troca espiar as finanças iranianas ao serviço do Governo norte-americano. Santos Ferreira propunha mesmo que as contas iranianas no BCP fossem controladas pelo Governo norte-americano, mediante um sistema satisfatório para o banco e para o governo dos EUA.
Santos Ferreira diz à embaixada dos EUA que informou José Sócrates, altos funcionários do Governo português e o governador do Banco de Portugal do interesse do Irão estabelecer uma relação com o Millenium BCP. A embaixada dos EUA conclui que, no mínimo, o Ministério dos Negócios Estrangeiros português está a par da proposta do banqueiro.
O telegrama da embaixada refere que poucas semanas antes da viagem da delegação do BCP, esteve em Teerão o embaixador Nuno Brito, do Ministério dos Negócios Estrangeiros português, que informou o vice-secretário de Estado norte-americano, William J. Burns, que Portugal não tem intenção de aprofundar as relações económicas com o Irão, ainda que “mantenha abertas as suas opções para futuros investimentos”.
O jornal espanhol refere que o BCP se negou a comentar o telegrama da embaixada dos EUA e lembra que Santos Ferreira foi presidente da CGD, tendo passado para o BCP na sequência do escândalo neste banco (relembre no esquerda.net: Promiscuidade entre política e negócios na luta pelo poder nos bancos e Relatório do BE sobre o Caso BCP). Lembra ainda que Santos Ferreira foi, no passado, deputado do PS e que o BCP foi de novo notícia com o escândalo Face Oculta, que envolveu Armando Vara, vice-presidente do banco.
O telegrama da embaixada norte-americana em Lisboa lembra ainda que Santos Ferreira já teve contactos com a embaixada iraniana em Lisboa no final dos anos 80, quando era presidente da Fundição de Oeiras, que vendeu “apetrechos militares ao Irão há mais de 20 anos”.
O El Pais lembra a propósito a relação não esclarecida entre a venda de armas ao Irão e o acidente de Camarate, em que faleceu Sá Carneiro.
Entretanto, o Bloco de Esquerda questiona o Banco de Portugal sobre a proposta do banqueiro à embaixada dos EUA.
O Bloco considera que a disponibilidade de Santos Ferreira, “junto do governo dos EUA violaria grosseiramente o dever de confidencialidade devido pelas instituições bancárias, podendo configurar crime, ao abrigo das disposições legais em vigor” e pergunta ao Banco de Portugal: se teve conhecimento “do interesse do BCP em negociar com instituições bancárias do Irão”; se teve conhecimento do BCP “em, subsequentemente, quebrar o dever legal de confidencialidade devido aos seus clientes” e, em caso afirmativo, “que resposta deu o Banco de Portugal”; e, por último, se o Banco de Portugal teve conhecimento “de iniciativas de teor semelhante, levadas a cabo pelo BCP ou outra instituição bancária sediada em Portugal”.
Esquerda.net

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