Tenho ideia que foi por altura da greve de professores de Janeiro de 2009 que uma jornalista do jornal Público entrou em contacto comigo para conversarmos mais uma vez sobre o tema. A conversa foi parar a um texto que tinha publicado neste bloque: o bloco da precaução, aqui.
A jornalista manifestou interesse em publicá-lo na edição impressa do jornal mas numa versão que eu teria de reduzir de modo substancial. Ao fim de umas duas ou três versões construídas em tempo reduzido e apressado, a coisa ficou sem a mesma força e foi parar às cartas ao director na edição do dia seguinte à greve, julgo eu.
Pode ler agora ou voltar a ler se for caso disso (mas pode também usar o link referido e dar uma vista de olhos pela edição completa, digamos assim).
O muro que asfixia as escolas e os professores.
Quem quer que se meta na aventura de reflectir sobre o estado do sistema escolar português pode escolher os mais variados pontos de partida. A minha opção navega na história mais recente e concentra-se no tratamento da informação.
Podia optar por "sistema escolar por blocos". Mas o conceito de bloco da precaução torna mais inteligível o que quero exprimir e reforça duas ideias: é, como espero que se veja, o bloco que mais asfixia o privilégio de ensinar e contamina de modo decisivo os outros dois: o do ensino e o da organização escolar.
Este bloco da precaução, que foi construído paulatinamente e que criou um muro de burocracia na gestão da informação escolar, é quase tão difícil de derrubar como o muro de Berlim.
O bloco da precaução caracteriza-se por um universo informativo que é obtido apenas para arquivo e que existe porque está determinado de modo central através das invenções técnico-pedagógicas do ministério da Educação. E é aqui que encontramos um imenso elenco de invenções burocráticas: inúmeras actas e relatórios sem parâmetros indicadores de informação estruturante, projectos educativos impossíveis de avaliar, projectos curriculares de turma e de escola, definição de objectivos com variadas designações de acordo com os gostos e os feitios dos promotores de ocasião. A lista é interminável.
A institucionalização do bloco da precaução, e a sua aparente autoridade, parte dos serviços centrais do ministério da Educação e alastra-se de modo quase acéfalo à organização de muitas das escolas. As invenções burocráticas devidamente preenchidas são, por precaução, a única consciência profissional de muitos estabelecimentos de ensino; isso retira sentido de autonomia e de responsabilidade e gera fenómenos de subserviência e de medo.
In Correntes
0 comentários:
Enviar um comentário