Comemorações do 35º aniversário do 25 de Abril em Portimão
Intervenção de João Vasconcelos, pelo B E, na Sessão Solene
Salão Nobre da Câmara Municipal de Portimão
Sr. Presidente da Assembleia Municipal
Sr. Presidente da Câmara
Senhoras e Senhores Autarcas
Excelentíssimas Autoridades Civis e Militares aqui presentes
Senhoras e Senhores Convidados
Minhas Senhoras e meus Senhores
Em 1974, uma guerra colonial injusta, que durante anos ceifou milhares de vidas de inocentes de portugueses e africanos, aprofundava irremediavelmente a crise em que apodrecia o velho regime fascista.
Há 35 anos, em 25 de Abril, o golpe militar dos capitães fez ruir o regime e, por essa brecha, irrompeu um amplo movimento popular revolucionário que transformou radicalmente o nosso País.
Em 1974 e 1975, o Processo Revolucionário em Curso, o PREC – para nós de boa memória --- venceu resistências, fez ruir os pilares do regime, arrancou conquistas sociais e políticas que, apesar de tudo, ainda hoje perduram, abriu caminhos de futuro, apontando à modernidade.
Aos historiadores cabe a tarefa de escrever a história do 25 de Abril e contar as suas estórias. Aos cidadãos e às cidadãs cabe defender as suas conquistas, aprofundar os seus ideais e, mais importante do que parece, não deixar apagar a memória.
A todos, cabe-nos manter vivo o ideal democrático, no sentido mais avançado das suas conquistas.
Já há 35 anos se ouvia o discurso que o País “é pobre” e que, portanto, “não pode dar muito aos seus filhos” --- um discurso que, curiosamente, décadas depois continua a ter seguidores, vindos de onde menos se esperaria.
Esse discurso foi então arrasado pela luta do povo português, em amplas e pujantes movimentações populares.
Impôs a dissolução da PIDE e acabou com a Censura. Arrancou ganhos salariais significativos, conquistou o subsídio de férias e o 13º mês, construiu o Serviço Nacional de Saúde geral, universal e gratuito. Levou a Escola Pública e serviços essenciais a todos os cantos do continente e das regiões autónomas. Impôs a nacionalização de serviços essenciais, como o da produção e distribuição de energia eléctrica.
Aliás, o povo português mostrou nas ruas saber que democracia tem a ver com a vida, mais do que com palavras.
Democracia com serviços públicos de qualidade e para todos --- em oposição às ondas privatizadoras que vieram a seguir, para engordar banqueiros e gestores, alimentar off-shores obscuros, manter contas na Suíça, sustentar ordenadões e prémios chorudos aos rapazes do costume. Tudo com os recursos públicos que são de todos e encaminhando a economia para o desastre que hoje está à vista de todos.
Democracia com permanente atenção aos mais fracos, aos desempregados, aos trabalhadores precários, sem salário certo, sem direitos e sem futuro; aos mais excluídos do desenvolvimento desigual para que os do costume, à vez, vêm há anos a arrastar o nosso País.
Democracia com cidadãos informados, democracia com rigor, com visão de futuro e com transparência, preservando acima de tudo o interesse público em detrimento dos interesses privados - seja na gestão económica e financeira, seja no planeamento e na gestão do espaço urbanizável e urbanizado.
A falta de informação ou as dificuldades criadas ao seu acesso, a opacidade nas decisões da administração, a apropriação privada de dinheiros públicos, esvaídos em negócios escuros ou em má gestão, são contrários aos ideais do 25 de Abril. Ontem exigia-se e hoje continua a exigir-se uma gestão transparente, uma democracia participada por cidadãos informados, um confronto democrático leal e aberto.
Aliás, o combate à corrupção a todos os níveis é hoje, um imperativo de respeito pelo 25 de Abril.
O 25 de Abril, libertando-nos de uma ditadura, permitiu-nos estabelecer relações com todos os países e povos do Mundo, em pé de igualdade.
As relações seculares com os povos das ex-colónias, outrora marcadas pelo opróbrio do colonialismo, podem hoje desenvolver-se fraternalmente, na base do respeito mútuo. E nem o facto de, nalguns casos, ao colonialismo português se terem sucedido cliques corruptas e rapaces, autorizam qualquer visão saudosista sobre um passado muito negro de opressão e exploração coloniais.
Hoje, a democracia e a cidadania conquistadas com o 25 de Abril têm de alargar-se à União Europeia, um novo espaço em que se decide o nosso futuro como povo e como país --- um espaço em profunda crise económica, social e política, em resultado do liberalismo ultra-conservador imposto em nome da ditadura do mercado.
Democracia à escala europeia quer dizer uma refundação democrática em que, também na Europa, seja o povo quem mais ordena --- e não o mercado. Nos diplomas fundacionais da nova Europa terá de ser incorporado o que demais avançado existe em cada país, consagrado numa Constituição democraticamente discutida e aprovada.
Bem sabemos que quem nos meteu na crise não nos fará sair dela. Mas, também aí, como em 25 de Abril, sabemos que a participação e a luta dos povos podem impor as necessárias rupturas políticas e encontrar os novos protagonistas que lhe darão rosto.
Antes desta crise nova Portugal já vivia uma profunda crise velha. Agora a crise é a redobrar, em grande parte fruto das políticas do actual governo PS do engenheiro Sócrates. Hoje temos o valor mais alto de desemprego dos últimos 30 anos com cerca de 600 mil desempregados, metade dos quais sem direito a subsídio de desemprego, centenas de milhares de precários, dois milhões de portugueses na pobreza e a passar fome, dos quais 300 mil são crianças. É a crise na saúde, com as diversas tentativas de se destruir o SNS – uma das conquistas mais emblemáticas de Abril, entregando as partes lucrativas aos privados. A Escola Pública tem sido atacada e vilipendiada como nunca houve memória desde Abril.
Quanto à justiça, não há palavras – trata-se do maior escândalo nacional! Com tantos casos de indícios de corrupção parece que tudo é arquivado e os acusados e arguidos passam a ser as vítimas inocentes. Alguém acredita, por exemplo, que no BPN apenas existirá um possível culpado? Os cidadãos com menos posses não têm meios para recorrer à justiça, no país temos uma justiça só para os ricos, tal como ainda ontem referiu a Ordem dos Advogados. O que Portugal necessitava era de uma autêntica Operação Mãos Limpas! Se calhar irá ocorrer, mais cedo do que se espera. Só assim se cumprirá Abril no campo da justiça.
A velha crise, associada à crise nova, tem sido a marca da governação das últimas mais de 3 décadas dos governos PS, mas também dos governos PSD/CDS-PP, agravada nesta última legislatura. Não foi para isto que se fez o 25 de Abril.
Minhas senhoras e meus senhores,
Em Portimão, 35 anos passados depois de Abril, muito se fez nos campos da rede viária, do saneamento básico, da habitação, da educação, da saúde, da cultura. Todavia e em particular o poder local, podia ter feito mais e melhor, muito mais e muito melhor. Se dois dos D’s de Abril – Descolonizar e Democratizar se cumpriram, digamos assim, o outro D – Desenvolvimento, ainda continua muito aquém do que seria desejável.
Um Desenvolvimento digno desse nome, deverá abranger todas as áreas, de forma equilibrada e sustentável, e incluir todas as pessoas, sem exclusões. Construir muitas torres de betão e cimento armado, edificar nas arribas e falésias não tem nada a ver com desenvolvimento sustentável. Não proteger devidamente as áreas protegidas, como a Ria de Alvor, produz graves desequilíbrios e torna-se insustentável em termos ambientais. Subsidiar e patrocinar os grandes grupos económicos privados, com dezenas de milhões de euros e, dizer que não há uns trocos para pagar um simples funcionário para fazer vigilância nas escolas com essa necessidade, torna-se inaceitável e é o contrário de desenvolvimento.
Se há tantos milhões para os patrocínios, para os grandes espectáculos e festas faustosas, porque não atacar e erradicar de vez a fome que grassa no nosso concelho, porque não se aplica algum desse dinheiro para eliminar a pobreza e a exclusão que, curiosamente, não pára de crescer? Apesar de tanto investimento, de tantos eventos e tantas festas, Portimão afirma-se neste momento como o concelho onde há o maior número de desempregados no Algarve, mais de 5 mil – uma autêntica tragédia. Alguma coisa aqui não bate certo.
Este município também permite e autoriza a instalação de grandes superfícies comerciais que vão polvilhando a nossa cidade como cogumelos. Depois de tudo construído Portimão será digno de figurar no Guiness Book, pois terá a maior área coberta, do mundo, a nível de grandes superfícies comerciais. Consequências – uma calamidade: a cidade ficará ainda mais bloqueada e desertificada, o pequeno comércio tradicional levará o golpe final e muitas mais pessoas e famílias serão atiradas para a miséria. Mas que belo desenvolvimento este.
Algumas palavras sobre as Empresas Municipais e as S. A.’s que já são cerca de 10! Um outro record muito difícil de bater. A Câmara Municipal, paulatinamente, vai alienando todas as suas competências e serviços públicos e, o que é mais grave, favorecendo os privados em detrimento da coisa pública. É a sociedade do Pavilhão Arade, do Arena, da zona ribeirinha, do turismo, dos mercados e feiras, das águas e resíduos, dos parques, da reabilitação urbana, da gestão de tudo isto, etc. Por este andar teremos os futuros Gatil e Canil, a Quinta Pedagógica, o viveiro municipal, ou a secção de rega e jardinagem, transformados em novas Empresas Municipais e S. A.’s. Que restará para a Câmara Municipal e o seu Presidente? Isto faz-nos lembrar a derrocada e desaparecimento da antiga União Soviética, em que cada República foi declarando a sua independência, restando apenas o Presidente, Gorbatchov, que ficou sem país para governar.
Por último, direi que ao longo destes últimos anos o Bloco de Esquerda tem sido uma oposição construtiva e assim procurará nortear a sua actuação. Temos apresentado diversas propostas, muitas delas aprovadas por maioria e até por unanimidade, incluíndo pelo Partido Socialista. Destaco apenas duas dessas propostas – a aplicação de descontos nos transportes Vai Vem aos cidadãos portadores de deficiência e, muito recentemente, a constituição de um Gabinete Anti-Crise, para ajudar a combater a pobreza e exclusão social e o endividamento de famílias e pequenas empresas. Só lamentamos que o executivo municipal não ponha em prática outras propostas aprovadas, como seja a construção de uma passagem aérea para peões sobre a antiga EN 125, no Bairro Cruz da Parteira, a construção de uma protecção junto ao rio, na zona ribeirinha, a implementação do orçamento participativo, ou por exemplo, a construção de ciclovias na cidade.
33 anos de gestão do Partido Socialista é muito tempo. É tempo de começarmos a construir uma alternativa – com confiança, responsabilidade e determinação. Por uma absoluta transparência, a favor de uma melhor qualidade de vida e de uma melhor justiça social para todos, sem exclusões. A nossa finalidade será a defesa intransigente dos interesses e reivindicações dos Portimonenses, dos cidadãos do nosso concelho e, em particular, dos que mais precisam. Continuaremos a lutar para que Abril se cumpra, em toda a sua plenitude.
Cada um que assuma as suas responsabilidades. Seremos propositivos e consensuais quando tiver de ser. Mas também não temos receio de assumir rupturas quando forem necessárias. Estaremos abertos a Juntar Forças. Em prol de Portimão e do país.
Termino com uma saudação, justa e devida, aos militares do 25 de Abril.
Tiveram a visão de um país livre e mais justo, livre da guerra colonial. E tiveram a coragem de pegar em armas por ele. Aqui está uma vibrante lição de cidadania que a nossa história registará e um exemplo a que nós prestamos um sentido tributo.
0 comentários:
Enviar um comentário