sábado, maio 19, 2012

“É tempo de mudar o mapa e de impor uma alternativa ao desastre que estamos a viver”

Na sessão de encerramento da Conferência Económica Internacional “Portugal na encruzilhada da Europa”, Francisco Louçã deixou duas reflexões: uma sobre a política europeia e outra sobre a situação da Grécia e as lições a retirar do caso grego.
Em primeiro lugar, o coordenador da Comissão Política do Bloco referiu-se à proposta apresentada pelo “senhor Trichet, ex governador do Banco Central Europeu (BCE) e que foi durante muito tempo a segunda pessoa mais importante da União Europeia, o ‘vice Merkel’.
Louçã frisou que a solução para a Europa apresentada por Trichet na Cimeira do G8 em Washington, e que constitui “a mais radical das soluções federais levadas ao seu extremo”, “tem uma longa história, porque já foi sucessivamente usada pelo menos em sete países diferentes e em momentos diferentes”.
Segundo adiantou o dirigente bloquista, a proposta de a Comissão Europeia tomar “conta da governação de qualquer país que não esteja a cumprir os seus acordos de austeridade com a União e, portanto, confiscar o poder de decisão orçamental e tributário desses países”, já foi aplicada no México, pela França em 1862, no Egito, pela França e Inglaterra em 1876, no Perú em 1889, na Republica Dominicana, pelos EUA e potências europeias em 1905 e 1916, na Nicarágua, em 1902 e 1911, e no Haiti, em 1916, e sempre com o mesmo objetivo: “tomar conta do sistema tributário que irá ser utilizado para financiar o sistema financeiro de cada um dos países credores”.
E “as palavras do Sr. Trichet são para levar a sério”, alertou Francisco Louçã, porque “são precisamente um ensaio de algo que outros não podem dizer mas ele vai antecipando”.
“A dívida é a força, a cobrança é a força. A austeridade é a força, e a austeridade impõe-se mesmo que seja contra a vontade dos povos”, sublinhou Louçã, adiantando que Trichet, ao querer impor esta solução, não se deve esquecer que “não se entra na Grécia e em Portugal para dizer agora governamos nós sem que isso passe por uma exibição de força e por uma imposição de força que vá muito além da chantagem que está agora em curso”.
As lições a retirar do caso grego
Segundo o dirigente bloquista, mediante as últimas eleições na Grécia, e as já agendadas para junho, ganhámos a perceção de que “o tempo se esgotou e de que o mapa já mudou.
Louçã frisou que a discussão sobre “se é um partido de esquerda ou de direita, ou um partido da troika ou que se opõe à troika” que governará a Grécia “é um facto absolutamente novo na política europeia” e que é possível retirar quatro lições do caso grego.
Primeiro, que a “troika é insuportável”. “A austeridade chegou ao seu limite”, sendo que a “Grécia demonstrou que não existe economia que possa resultar com aquela punição”.
Segundo, que, se a troika é “insuportável”, os partidos da troika serão derrotados, “porque uma parte importante do povo não aceita a continuidade das políticas da troika”. “A esquerda na Grécia cria a rutura com a troika e é isso que lhe permitiu ascender à posição de propor um governo e de propor uma alternativa”, avançou Louçã.
Terceiro, que os partidos de uma esquerda contra a troika ganharam nas eleições da Grécia, e é a primeira vez que tal acontece na Europa. “A Syriza representou a esquerda que, com consequência, com alternativa, com pragmatismo, com capacidade de diálogo, com força de compromisso, com respeito pelos seus valores e com uma proposta clara perante com o país, vem romper com a troika, recusar a dívida ilegítima, restabelecer as condições para defender o salário e as pensões, trazer a economia para a democracia e impor democracia na economia", adiantou o deputado bloquista, afirmando ainda que “foi assim que ela venceu e é assim que disputa a possibilidade de formar governo”.
Na opinião de Francisco Louçã, a quarta lição a retirar do caso grego é a de que um governo da Grécia que se opõe à política de austeridade “é hoje a única possibilidade que a Europa tem de enfrentar a senhora Merkel”. “Não há nenhuma outra que, nas próximas semanas, nos próximos meses, nos possa dizer: há uma Europa que começa a mobilizar-se para vencer à austeridade e para recusar a recessão”, sublinhou o dirigente do Bloco.
Se assim acontecer, defendeu Louçã, ”teremos uma mudança de política muito profunda”. E, por isso, “essa esperança merece toda a nossa atenção e toda a nossa solidariedade”.
Se é possível haver um governo de esquerda, ele baseia-se, segundo Francisco Louçã, “exatamente na convicção de que qualquer destes países tem os recursos e a Europa tem a responsabilidade de criar uma economia de respeito, sustentável, socialmente equilibrada, que possa combater o desastre económico e recuperar os salários e as pensões para a vida das pessoas”.
É tempo de mudar o mapa
O desemprego no nosso país, que atinge acima de um milhão de pessoas, traduz-se  em perdas de “30 a 40 mil milhões em produção e em contribuições para a segurança social”, destacou Louçã.
“Onde a economia morre e onde colapsa o sistema fiscal é onde há desemprego”, avançou, defendendo que “esses recursos que se perdem pela política da desigualdade são os que podem fazer uma economia que responda às pessoas, e a grande viragem que nós precisamos na economia portuguesa é precisamente a política do emprego, do investimento, da sustentação”.
Para Francisco Louçã, “agora é o tempo de mudar o mapa, agora é o tempo de não esperar mais, de não ter meias palavras. É o tempo da coragem, da força, da determinação, da democracia, da luta por uma governação que à esquerda traga uma alternativa ao desastre que estamos a viver”.
“Esta é a única forma de enfrentar a chancelaria de Berlin, de vencer a direção da União Europeia, de vencer o Fundo Monetário Internacional, de recuperar Portugal, a democracia e a Europa”, rematou o dirigente bloquista.
Esquerda.net

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