quarta-feira, maio 02, 2012

Manifestações do 1º de Maio

CGTP contra arrogância de patrões, UGT contra excesso de austeridade

Por Carlos Pessoa, Nuno Ribeiro - Público
<p>Manifestação da CGTP</p> Manifestação da CGTP
 (Nuno Ferreira Santos)
Nas concentrações que convocaram para Lisboa, as duas centrais sindicais portuguesas deixaram críticas ao Governo. A UGT acusou o Executivo de Pedro Passos Coelho de “só se preocupar com a austeridade”, enquanto a CGTP responsabilizou “os Governos das últimas décadas” pela situação económica do país. Esta central sindical criticou ainda a "arrogância de alguns patrões que pretendem voltar aos tempos de Salazar e Caetano".

Dois sonoros assobios, um ao Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, e outro ao ministro das Finanças, Vítor Gaspar, foram os momentos altos do comício com o qual terminou hoje, na Alameda Afonso Henriques, em Lisboa, a manifestação do 1º de Maio. No desfile, que reuniu muitos milhares de pessoas e que concluiu com uma concentração que encheu a área da Alameda compreendida entre a Fonte Luminosa e a Avenida Almirante Reis, foram vivamente criticadas as políticas do Governo. “Eles têm medo que o povo perca o medo”, disse o secretário-geral da central, Arménio Carlos.

“Os trabalhadores não são peças descartáveis para usar e deitar (…) são homens, mulheres e jovens que exigem ser respeitados”, salientou o líder da Intersindical. A esta radiografia do momento presente, o dirigente da CGTP contrapôs outra política: “Os direitos laborais e sociais têm de se constituir em objectivos da política económica e, assim constituídos, são motor de maior desenvolvimento”. De alguma forma, no trajecto do Martim Moniz à Alameda, a reivindicação de um novo rumo foi proclamada, mesmo gritada.

“Assim não vai dar, sempre os mesmos a pagar”, era uma das 26 palavras de ordem definidas pela CGTP para o 1º de Maio de 2012. Um Dia do Trabalhador comemorado depois da intervenção da troika e da aplicação de consecutivas medidas de austeridade. “Sinto uma grande revolta, estou muito revoltada, a minha reforma não chega aos 50 contos”, diz uma antiga metalúrgica de 72 anos, dos Cabos Ávila, que prefere o anonimato: “Não digo o meu nome, não lho digo”. Ao seu lado, junto à estátua da Praça do Chile, uma amiga, também idosa, concretiza os lamentos: “Nem dinheiro tenho para uma dentadura”.

O discurso de Arménio Carlos veio de encontro a este sentimento, um ano depois de Portugal ter pedido ajuda financeira. “Temos um ministro das Finanças que agora acumula a pasta da propaganda e pretende transformar aquela que era a sua verdade absoluta de ontem na mentira de hoje”. A assistência apupou a referência a Vitor Gaspar e relembrou, entre não poucos insultos, a mais recente data avançada para a reposição na totalidade dos subsídios aos funcionários públicos e reformados: 2018. Por isso aplaudiu com intensidade a “bucha” do secretário-geral da Intersindical. “Estão cá a mais estes políticos”.

“Um Presidente da República que em vez de falar dos problemas reais dos portugueses dá cobertura a uma política que despede os pais e nega emprego aos filhos”, acusou o sindicalista Cavaco Silva. Ao PR foi destinada a mais sonora e prolongada vaia da tarde. “É a política do retrocesso”, sintetizou Arménio Carlos. “E ainda o Cavaco diz que a reforma não lhe chega”, desabafara, minutos antes, a antiga metalúrgica.

As críticas não se limitaram aos dois políticos. O Governo foi acusado de praticar um “ajuste de contas com Abril e as suas conquistas”. E relembrados os que subscreveram o memorando: “PSD, CDS e PS à revelia e nas costas do povo”. Um memorando “que promove as injustiças e as desigualdades, generaliza o empobrecimento da população, aumenta a exclusão social e põe em causa a democracia e a soberania nacional”.

Engana-se quem pensar que o discurso do “homem forte” da CGTP se limitou aos partidos do arco da governação. Arménio Carlos também se referiu a algum patronato: “… a arrogância de alguns patrões que pretendem voltar aos tempos de Salazar e Caetano querendo apagar o significado e o simbolismo deste dia”. Concretizou: “São os primeiros a retirar os lucros de Portugal e a pagar os seus impostos nos paraísos fiscais”.

E não esqueceu, por fim, a UGT. Na recordação da memória dos incidentes no Porto nos quais há 30 anos morreram dois operários activistas da CGTP. “Pedro Vieira e Mário Gonçalves lutavam contra os que pretendiam “partir a espinha à Intersindical”, precisou. Noutra referência, a central de João Proença voltou à berlinda. “Nós não alimentamos bluff´s de incumprimento de Acordos”, disse, semana e meia depois do secretário-geral da UGT ter acusado Pedro Passos Coelho de não cumprir o acordado. “O acordo no que pior tem está a ser aplicado”, concluiu o dirigente da CGTP. Ou ainda quando, depois de se mostrar aberto – “somos um movimento sindical que não nega esforços à busca de consensos e acordos “-, reiterou a fasquia inultrapassável: “Desde que visem a defesa dos trabalhadores e o progresso do país, mas que não vende direitos, não trai e não capitula”.

Não seria o 1º de Maio de 2012 a data para outro discurso, quando são recentes as feridas. Apesar das duas centrais sindicais terem estado unidas na greve geral de 24 de Novembro passado, os desacordos relativos ao acordo de concertação social de Janeiro último cavaram trincheiras. Nos activistas que hoje desceram à rua não havia apelos a qualquer aproximação das centrais. Subscreveram com aplausos as críticas de Arménio Carlos. “Faço parte dos precários, vou-me safando”, desabafa Ricardo, 41 anos, enquanto dá música aos concentrados no Chile que esperam a cabeça da manifestação. “Tenho sorte, estou a trabalhar, enquanto há outros que aqui estão pelo amor à camisola”, reconhece. Noutro posto, nos Anjos, o som também ameniza a espera e acompanha a marcha: “É preciso, é urgente uma política diferente!”.

Governo "só se preocupa com a austeridade"
Gigantones e grupos de bombos animaram o desfile de 1º de Maio da UGT em Lisboa. Foram exigidas políticas activas de emprego ao Governo, acusado de só se preocupar com a austeridade.

Pouco passava das 15 horas quando a manifestação do 1º de Maio promovida pela União Geral dos Trabalhadores (UGT) começou a descer a avenida da Liberdade, em Lisboa. À cabeça seguiam os principais dirigentes da central sindical, com destaque para João de Deus (presidente) e João Proença (secretário-geral).

Concentrados junto ao Marquês de Pombal, os manifestantes desceram a avenida em direcção aos Restauradores, entoando palavras de ordem e acompanhados por cabeçudos e grupos de bombos vindos de vários pontos do país que deram animação ao desfile.

Sob o lema “Mais emprego e justiça social”, as comemorações deste ano puseram a tónica na rejeição da precariedade e dos cortes salariais, e pela defesa do emprego e da solidariedade numa Europa social.

A expectativa dos dirigentes da central sindical era de uma manifestação muito forte, para a qual se esperavam 30 mil pessoas. Luís Correia, secretário-geral adjunto da UGT, garantiu ao PÚBLICO que “estava mais gente do que no ano passado”, mas escusou-se a adiantar números. Em contrapartida, destacou a presença nas comemorações dos principais dirigentes dos sindicatos que integram a central sindical.

Na sua intervenção, o presidente da UGT defendeu a assinatura do acordo em sede de concertação social, considerando que “é melhor do que o acordo com a Troika, em especial na área do mercado de trabalho”. No entanto, João de Deus teceu críticas ao Governo, acusado de “negligenciar” as políticas e medidas de crescimento económico: “O Governo tem de arrepiar caminho e iniciar a discussão sobre as políticas activas de emprego.”

João Proença, por seu turno, acusou o Governo de só “se preocupar com a austeridade” e lembrou que “as dificuldades financeiras não podem fazer esquecer as dificuldades económicas e sociais”.
Para o secretário-geral da UGT, chegou a hora de iniciar o combate ao desemprego, entendido como a “prioridade das políticas públicas”: “Queremos num ciclo virtuoso de crescimento e de emprego.”
Depois de lembrar que a força da UGT reside na sua independência e unidade, assegurou que os sindicatos “estão preparados para a defesa dos trabalhadores e do país”, no âmbito de uma “União Europeia diferente, que tem de ser um motor do desenvolvimento económico e social”.

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