domingo, agosto 17, 2008

Para se entender toda a monstruosidade do novo ECD temos de conjugar os conteúdos funcionais do artigo 35º com os deveres do artigo 10º


Foto de André Beja, in Flickr.com
Para se entender melhor a monstruosidade do artigo 35º do Decreto-Lei 15/2007 é necessário conjugar as 20 alíneas que correspondem a outros tantos conteúdos funcionais com os deveres dos professores expressos no artigos 10º, 10ºA e 10ºB do Decreto-Lei 15/2007. Agradeço à colega Maria Lisboa ter chamdo a atenção para esta conjugação. Repare-se:

Se cruzarmos o conteúdo profissional do professor, expresso neste artigo 35º do Decreto-Lei 15/2007 (ECD), expresso nas 14 alíneas para todos, às quais acrescem 6 alíneas para os titulares, com os deveres expressos:

1. No artigo 10º - deveres gerais (todos os da Administração Pública mais os gerais específicos dos professores contabilizados em 8 alíneas).

2. Artigo 10º A: Deveres para com os alunos (são 10 os descritos).

3. Artigo 10º B: Deveres para com a escola e os outros docentes (8 no total).

4. Artigo 10º C: Deveres para com os pais e encarregados de educação (5 no total).

Conteúdos funcionais e deveres

Veremos que o conteúdo funcional é exponencialmente multiplicado, porque muitos dos deveres descritos nos artigo 10º implicam acções de conteúdo funcional não descritas, como por exemplo:

i. Participar na promoção de acções específicas de formação ou informação para os pais ou encarregados de educação que fomentem o seu envolvimento na escola com vista à prestação de um apoio adequado aos alunos (dever que não sendo um conteúdo funcional, tal como outros que não o são, acaba por ser equacionado na avaliação feita pelo Presidente do CE).

Se agarrarmos neste emaranhado de itens de conteúdo funcional/deveres e o cruzarmos com o perfil geral de desempenho profissional estabelecido nos Decretos-Lei nº 240/2001 de 30 de Agosto e nº 241/2001 de 30 de Agosto, percebemos rapidamente, no final da análise, que o conteúdo funcional do professor não se resume, apenas, àquelas 20 alíneas.

Aliás, tudo isto fica bem claro quando colocamos, lado a lado, todas estas funções e as grelhas de avaliação com os seus inúmeros itens propostos para serem avaliados (Maria Lisboa).

Deveres que configuram uma total submissão dos professores
Os deveres dos professores descritos nos artigos 10º, 10º A, 10º B e 10º C do Decreto-Lei 15/2007 configuram um quadro de total submissão dos docentes à administração educativa e, muitos desses deveres vêm associados a mais conteúdos funcionais e à total perda da liberdade pedagógica. A leitura desses deveres, torna-se necessária para compreendermos o alcance da monstruosidade imposta pelo Governo PS a toda uma classe profissional composta por 150 mil portugueses com elevados graus académicos:

Artigo 10º
O pessoal docente está obrigado ao cumprimento dos deveres estabelecidos para os funcionários e agentes da Administração Pública em geral.
2—O pessoal docente, no exercício das funções que lhe estão atribuídas nos termos do presente Estatuto, está ainda obrigado ao cumprimento dos seguintes deveres profissionais:
a) Orientar o exercício das suas funções pelos princípios do rigor, da isenção, da justiça e da equidade;
b) Orientar o exercício das suas funções por critérios de qualidade, procurando o seu permanente aperfeiçoamento e tendo como objectivo a excelência;
c) Colaborar com todos os intervenientes no processo educativo, favorecendo a criação de laços de cooperação e o desenvolvimento de relações de respeito e reconhecimento mútuo, em especial entre docentes, alunos, encarregados de educação e pessoal não docente;
d) Actualizar e aperfeiçoar os seus conhecimentos, capacidades e competências, numa perspectiva de aprendizagem ao longo da vida, de desenvolvimento pessoal e profissional e de aperfeiçoamento do seu desempenho;
e) Participar de forma empenhada nas várias modalidades de formação que frequente, designadamente nas promovidas pela Administração, e usar as competências adquiridas na sua prática profissional;
f) Zelar pela qualidade e pelo enriquecimento dos recursos didáctico-pedagógicos utilizados, numa perspectiva de abertura à inovação;
g) Desenvolver a reflexão sobre a sua prática pedagógica, proceder à auto-avaliação e participar nas actividades de avaliação da escola;
h) Conhecer, respeitar e cumprir as disposições normativas sobre educação, cooperando com a administração educativa na prossecução dos objectivos decorrentes da política educativa, no interesse dos alunos e da sociedade.

Dispenso-me de transcrever o conjunto de deveres dos professores expressos nos artigos 10º A, 10º B e 10º C porque o post já vai grande demais. Fá-lo-ei noutro post. Aconselho a leitura dos deveres para com os alunos (10º A), para com a escola (10º B) e para com os pais (10º C) para se perceber o alcance da monstruosidade e da redução a zero da liberdade pedagógica dos professores. Os colegas podem fazer essa leitura, clicando aqui.

Os sindicatos têm de apresentar argumentos contra o artigo 35º
Os sindicatos têm de utilizar estes argumentos na comissão paritária de acompanhamento do processo de avaliação de desempenho, nas reuniões de negociação e nos debates que, muito provavelmente, irão ser feitos nas televisões durante o próximo ano lectivo. Se os professores que integram o Conselho Científico para a Avaliação dos Professores merecessem ainda algum crédito, eu diria que eles deviam também usar esta argumentação nos documentos que aquele órgão consultivo do ME aprova e publica. Contudo, a história recente do CCAP leva-me a crer que isso não será feito.
ProfAvaliação

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