CONTINUA O MAU CAMINHO
Numa maratona contra o tempo, contra os trabalhadores e os seus protestos na rua, contra as
desconfianças e as críticas internas no partido e dos partidos à sua esquerda, o 1º ministro e o governo aprestam-se
para aprovar a actual proposta de revisão do Código de Trabalho, pô-la à discussão pública e no Parlamento, e,
garantida a votação ainda nesta sessão legislativa, pô-la em vigor logo no início de 2009.
A versão final acordada no passado dia 25 de Junho entre o Governo, as associações patronais e a UGT, embora
retocada à última hora, é muito negativa para os trabalhadores, para os sindicatos que, melhor ou pior, procuram
defender os interesses do trabalho e para o correcto desenvolvimento económico do país. Negativa o bastante para
levar a CGTP à recusa de a subscrever e os trabalhadores a protestarem na rua na manifestação de mais de 200 000
mil pessoas, em Lisboa no dia 5 de Junho, e logo de seguida a 28, de novo em Lisboa e em mais 17 capitais distritais.
Entre as alterações propostas ao Código em vigor ressaltam as que intensificam a flexibilidade horária. Entre outras
medidas, pela possibilidade da realização de 36 horas de trabalho em 3 dias seguidos, ou quatro por semana.
Bastando apenas (ao contrário de até agora para este tipo de alterações) o acordo entre o trabalhador e a entidade
patronal, sem qualquer outra mediação, nem sindical nem do contrato colectivo. Sabendo-se como em tantas
situações os trabalhadores se encontram completamente sujeitos à vontade patronal, é evidente a quem servem estes
“acordos pessoais”. A mesma intenção tem a generalização dos “bancos de horas” em que os patrões podem,
consoante a sua conveniência e por compensação de uns períodos em relação a outros, alterar os horários de
trabalho. Tudo de forma a evitar ao máximo o pagamento de horas extraordinárias e a contratação de “mão de obra”
mesmo que temporária, reduzindo ainda mais os custos do trabalho (os salários) à custa dos trabalhadores.
O prazo para a caducidade dos contratos colectivos é reduzido de dez para cinco anos. O que, para além de
prejudicar a maioria dos trabalhadores que beneficiam de contratos com clausulados que as associações patronais
querem rever para pior, prejudica também os sindicatos (CGTP) que negociaram esses acordos e em breve poderão
ver o(s) governo(s) a privilegiar todas as negociações com sindicatos minoritários ou inexpressivos só porque aceitam
“por dá cá aquela palha” as propostas governamentais.
Embora o acordo contenha redução dos contratos a prazo de seis para três anos, são conhecidos todos os
estratagemas que o patronato usa para driblar a passagem dos trabalhadores a efectivos, desde o simples
despedimento para novo contrato logo seguir, até às muitas outras formas de precariedade, legais e ilegais, para
evitar fazerem contratos mesmo a prazo. Formas em que o governo dá o exemplo mais escandaloso com os seus
“colaboradores” nos serviços públicos. Como se não bastasse, o período experimental passa agora de três para seis
meses ampliando mais esta forma de precariedade.
A grande cedência, contrapartida para a assinatura da UGT, foi a retirada da proposta de despedimento por
inadaptação funcional. Perante os enormes protestos laborais, na pressa de levar a UGT ao acordo e mantendo a
flexibilidade horária na revisão, o governo recuou nesse ponto com o beneplácito dos chefes patronais. Afinal, estes
sabem como têm estado e continuam à vontade para despedir à margem da lei dada a pressão do desemprego e a
inoperância da Inspecção do Trabalho.
Para culminar o processo e conseguir ainda a aprovação no Parlamento antes do fim do Verão, o governo propôs na
AR a redução do prazo da discussão pública de 30 para 20 dias. Naturalmente CDS/PP e PSD votaram a favor. A
CGTP denunciou a falta de democracia e a intenção governamental de ultrapassar o mais depressa possível os
protestos e as críticas a um acordo completamente ao arrepio das promessas eleitorais do PS. Pelo contrário, a
complexidade da revisão e a gravidade das suas propostas, juntando o texto do Código e a sua própria
regulamentação, a existência de aspectos ainda mal conhecidos e de duvidosa interpretação jurídica, a proximidade
das férias, tudo isso eram mais que motivo para o prolongamento do debate após a reabertura dos trabalhos
parlamentares.
Pois é, mas o interesse da democracia e dos trabalhadores nem sempre (quase nunca) coincide com os superiores
interesses do bloco central e do governo de turno.
Em síntese, recordo recentes palavras de Carvalho da Silva: 'De tempos a tempos fazem-se encenações e criam-se
expectativas de que estes acordos vão melhorar a economia e aumentar a competitividade do país, mas depois
constata-se que os trabalhadores estão mais explorados, o seu rendimento baixa, a competitividade não aumenta e o
país não se desenvolve”...
Um mau caminho que já vem de trás e que, pelos vistos, a não ser a oposição e luta cidadã e dos trabalhadores, é
para continuar.
Faro, 2/07/08
Vítor Ruivo
(Publicado no jornal Região Sul)
sexta-feira, julho 04, 2008
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Código do Trabalho
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