sexta-feira, julho 04, 2008

Fernando Pessoa via Fátima como meio para a construção do nacionalismo católico pelo Estado salazarista


O poeta português Fernando Pessoa encarava Fátima como o lugar mítico da construção do nacionalismo católico e monárquico que ele repudiava, sustentou o historiador José Barreto, antes de revelar um texto inédito do escritor sobre aquele lugar de culto.

"É um texto irónico, a roçar a sátira anticlerical, em que Pessoa parece regressar ao extremismo da juventude", disse José Barreto numa conferência sobre "Pessoa e Fátima. A prosa política e religiosa", proferida ao fim da tarde na Casa Fernando Pessoa.

O texto inédito descoberto pelo historiador e investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa é apenas "o preâmbulo de um artigo maior que teria o carácter de estudo de caso 'sobre o Catolicismo desde bom e mau povo'", explicou citando o poeta.

O artigo sobre Fátima deveria ser publicado no primeiro número da revista Norma, um dos três projectos editoriais de Pessoa no ano da sua morte, em 1935, o que não se chegou a concretizar.

Pessoa denunciava o aproveitamento da crença do povo por parte do poder político e afirmava: «o facto é que ha em Portugal um lugar que pode concorrer e vantajosamente com Lourdes. Ha curas maravilhosas, a preços mais em conta».

Pessoa acrescenta ainda:

«O negócio da religião a retalho, no que diz respeito à Loja de Fatima, tem tomado grande incremento, com manifesto gaudio místico da parte dos hoteis, estalagens e outro comércio d’esses jeitos - o que, aliás, está plenamente de accordo com o Evangelho, embora os católicos não usem lê-lo - não vão eles lembrar-se de o seguir!»

O texto escrito por Fernando Pessoa começa assim:
«Fatima é o nome de uma taberna de Lisboa onde às vezes… eu bebia aguardente. Um momento… Não é nada d’isso… Fui levado pela emoção mais que pelo pensamento e é com o pensamento que desejo escrever»

E continua:

«Fatima é o nome de um lugar da provincia, não sei onde ao certo, perto de um outro lugar do qual tenho a mesma ignorancia geografica mas que se chama Cova de qualquer santa»

«Nesse lugar - esse ou o outro - ou perto de qualquer d’elles, ou de ambos, viram um dia umas crianças aparecer Nossa Senhora, o que é, como toda gente sabe, um dos privilégios (…) a que se não (…). Assim diz a voz do povo da provincia e a ‘A Voz’ (jornal católico e monárquico) sem povo de Lisboa»


«Deve portanto ser verdade, visto que é sabido que a voz das aldeias e ‘A Voz’ da cidade de ha muito substituíram aquelas velharias democraticas que se chamam, ou chamavam, a demonstração científica e o pensamento raciocinado».

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Notícia retirada das agência Lusa
Blog Pimenta Negra

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